Em um interessante julgado, o CARF decidiu que a redução de preço por intermédio de descontos obtidos pelo contribuinte junto aos seus fornecedores se consubstancia em receita passível de incidência pelo PIS e Cofins.
No caso analisado, um supermercado recebia descontos dos seus fornecedores. Contudo, no contrato entre fornecedor e contribuinte havia uma cláusula que mencionava: “o presente desconto é decorrente de serviços logísticos prestados pelo …, tais como, entregas centralizadas, transportes, manuseio, armazenagem de mercadorias e/ou ferramentas de controle”.
Em vista disso, o supermercado foi acusado pela fiscalização de prestar serviços de logística, e que a redução de preço que o beneficiava não teria natureza de desconto incondicional (que não integra a base de cálculo do PIS e da Cofins) e tampouco de desconto financeiro (sujeito à alíquota zero), mas de verdadeira contraprestação por serviços prestados que integram a base de cálculo do PIS e da Cofins.
Segundo o fisco “o que efetivamente ocorre é que o contribuinte disponibiliza serviços para seus fornecedores e por eles cobra um determinado valor, caracterizando-se tal prestação como prestação de serviços”.
No caso se levantou um ponto fortíssimo a favor do contribuinte, segundo o qual, ninguém presta serviços a si mesmo. Segundo a linha de raciocínio vencida:
“a propriedade de bem móvel se transfere pela tradição, ou seja, pela entrega da coisa. Antes da tradição não há transferência de propriedade” (art. 1.267 do Código Civil).
“No caso de compra e venda de mercadoria, bem móvel por definição, a entrega física da coisa aperfeiçoa a transmissão da propriedade, que pode ocorrer no estabelecimento do comprador, se o vendedor assumir a responsabilidade pela entrega; ou no estabelecimento do vendedor, se couber ao comprador fazer a retirada dos bens.
Porém, em qualquer caso, no momento em que o comprador receba fisicamente as mercadorias, estas ingressam em seu patrimônio, pela aquisição da propriedade que se consuma com tradição. Daí em diante, o manuseio, o transporte, a remoção e a armazenagem se fazem por conta e risco do comprador, já então o proprietário dos bens.
Tais atividades, quando realizadas pelo proprietário das mercadorias, não assumem a natureza de prestação de serviço, porque ninguém pode prestar serviço a si mesmo, mercê da bilateralidade que caracteriza esse tipo de contrato. Por outro lado, tais atividades não podem ser tidas como serviço prestado ao vendedor, porquanto a este não proporcionam nenhuma vantagem ou benefício.
No contrato de prestação de serviço, o tomador é aquele em favor de quem a atividade é prestada e para quem ela proporciona uma vantagem. Logo, se o vendedor já não é o proprietário das mercadorias e se para ele o transporte, a remoção, o manuseio e a armazenagem não representam nenhum benefício, então ele não pode ser parte em um suposto contrato de prestação de serviço, que tenha por objeto aquelas atividades.
Essas são, em resumo, as razões pelas quais não se afigura correto considerar que os valores contabilizados pela impugnante como descontos possam ser reclassificados para receitas de prestação de serviço”.
Outro ponto da defesa muito interessante argumentava que a autuada sequer tem no seu objeto social a atividade de prestação de serviços.
Contudo, a brilhante linha de raciocínio não prevaleceu e, ao final, os descontos foram considerados receitas tributáveis para fins de PIS e Cofins.
Segue a parte da ementa referente a esse assunto:
“DESCONTO NA COMPRA DE PRODUTOS PARA REVENDA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS LOGÍSTICOS. CÔMPUTO NAS BASES DE PIS E COFINS. Não pode ser considerado como desconto, porém, como receita de serviços, tributável para fins de PIS e COFINS, a redução do preço de produtos adquiridos para revenda, cuja contrapartida é a prestação de serviços logísticos. RECUPERAÇÃO DE CUSTOS E DESPESAS. ENTREGA DE BENS E SERVIÇOS. CÔMPUTO NAS BASES DE PIS E COFINS. Não pode ser considerado como recuperação de custos ou despesas, porém, como receita da venda de bens e serviços, os valores recebidos em contrapartida da prestação de serviços ou venda de produtos”. (Número do Processo 10580.730133/2013-15, Data da Sessão 19/05/2016, Acórdão: 3301-002.978)
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.