Os contribuintes estavam obtendo relativo êxito no Judiciário anulado decisões do CARF baseadas em voto de qualidade.
Para relembrar, o Regimento Interno do Conselho, no seu art. 54 autoriza aos Presidentes das Turmas, o voto de qualidade nos julgamentos em que não há maioria simples. Eis o teor da norma:
“Art. 54. As turmas ordinárias e especiais só deliberarão quando presente a maioria de seus membros, e suas deliberações serão tomadas por maioria simples, cabendo ao presidente, além do voto ordinário, o de qualidade”.
Além disso, o Decreto nº 70.235/72, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal e que foi recepcionado com status de lei dispõem no o art. 25, § 9º que: “Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes dos contribuintes”.
Assim, quando há empate em um julgamento, situação muito comum quando há dúvida quanto aos fatos e a autoria, o presidente da turma profere o voto de desempate (voto duplo), geralmente em prejuízo dos contribuintes, pois o presidente sempre é um representante da Fazenda Nacional.
Essas circunstâncias têm levado ao inconformismo dos contribuintes, que procuram o Judiciário para anular os julgados assim proferidos, alegando se tratar de situação anti-isonômica e parcial.
Pela primeira vez um caso semelhante chegou ao Supremo Tribunal Federal. Trata-se de um mandado de segurança em que o juiz de primeira instância anulou o julgamento realizado pela 1ª Turma da Câmara Superior de Recurso Fiscais do CARF, determinando novo julgamento do recurso, sem a aplicação da regra do exercício do voto de qualidade. Posteriormente, a decisão foi suspendida por ato do Desembargador Presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Contudo, a decisão foi novamente revertida em julgamento de agravo interno pela Corte Especial do TRF1.
Em vista disso, a União Federal ajuizou Suspensão de Segurança, com pedido de liminar, com o objetivo de sustar os efeitos da decisão que anulou o julgamento realizado pelo CARF.
A União alegou que o voto de qualidade está previsto no Regimento Interno do CARF e no Decreto nº 70.235/72, recepcionado com status de lei ordinária e que, portanto, não há qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade na sistemática do voto de qualidade.
Para fundamentar a necessidade de concessão de liminar, a União argumentou que há grande quantidade de processos que discutem a mesma questão o que evidencia “grave risco de efeito multiplicativo na eventualidade de sua eficácia ser mantida”.
Alegou ainda que, a Constituição não exige a composição paritária dos tribunais administrativos.
Ao analisar o pedido de liminar, o Ministro do STF, Luiz Fuz deferiu o pedido da União para suspender a eficácia e a execução da sentença.
Para fundamentar a decisão destacou que, “a previsão de voto de qualidade pelo Presidente de Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais decorre de previsão normativa de nível legal, não se tratando apenas de previsão regimental infralegal”.
Ressaltou que “ao inovar na forma de funcionamento de órgão administrativo, a decisão ora questionada acaba por implicar potencial abalo à ordem pública, mais concretamente evidenciada pela alteração da ordem administrativa de funcionamento das instituições e de órgão relevante da estrutura do Poder Executivo”.
Disse que a decisão fustigada “revela possível impacto substancial à economia pública, eis que, segundo informa a União, o recurso administrativo cujo julgamento foi anulado relaciona-se a crédito tributário no valor de R$ 1.861.457.432,59 (um bilhão, oitocentos e sessenta e um milhões, quatrocentos e cinquenta e sete mil, quatrocentos e trinta e dois reais e cinquenta e nove centavos)”.
Mencionou ainda que “o efeito multiplicador se revela presente pelo risco de proliferação de demandas idênticas, haja vista a existência de inúmeros outros contribuintes em situação análoga”.
Segue ementa do julgado:
“SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA PROFERIDA EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE CONTRACAUTELA PARA GARANTIR O O EXERCÍCIO DA REGRA DO VOTO DE QUALIDADE PELO PRESIDENTE DE ÓRGÃO ADMINISTRATIVO. PERIGO DE GRAVE DANO À ORDEM E À ECONOMIAS PÚBLICAS. ARTIGO MULTIPLICADOR. LIMINAR DEFERIDA.” (Medida Cautelar na Suspensão de Segurança 5.282 – Distrito Federal – Publicado 27.02.2019, Ministro Luiz Fux).
Essa decisão do Ministro Fux, com certeza irá impactar os demais processos que tratam do tema de forma desfavorável aos contribuintes.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.