O Projeto de Lei que criou a Lei nº 4.357/64 pretendeu proibir, no seu artigo 32, a distribuição de dividendos e bonificações para as pessoas jurídicas que estivessem em débito não garantido com a União Federal e a Previdência Social. Ocorre que, o Presidente da República, manteve a bonificação, mas vetou a restrição quanto aos dividendos, mencionado na fundamentação do veto:
“A ingerência do Fisco em assunto da economia interna das empresas deve ficar restrita a casos excepcionais, evitando-se que os poderes de controle destinados a garantir a pontualidade no pagamento dos tributos e contribuições sejam transformados em elementos de perturbação da vida normal das empresas, que são os núcleos propulsores do desenvolvimento da economia nacional.
Sob essa ordem de idéias, parece aconselhável restringir os casos de intervenção, limitando-os às hipóteses essenciais. Delas deverão ser excluídos os casos de distribuição de dividendos e de pagamento por serviços prestados pelos dirigentes das empresas.
A exclusão dos dividendos torna-se mais aconselhável, ainda, no caso de acionistas minoritários, que ficariam prejudicados por erros de uma administração que, em geral, não teriam força para substituir”.
Em 2004, contudo, houve nova alteração no artigo 32 da Lei nº 4.357/64. De fato, a Lei 11.051/2004 incluiu o § 1º, I, ao caput do art. 32. O artigo ficou assim redigido:
“Art 32. As pessoas jurídicas, enquanto estiverem em débito, não garantido, para com a União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, por falta de recolhimento de impôsto, taxa ou contribuição, no prazo legal, não poderão:
a) distribuir …(VETADO) …quaisquer bonificações a seus acionistas;
§ 1o A inobservância do disposto neste artigo importa em multa que será imposta:
I – às pessoas jurídicas que distribuírem ou pagarem bonificações ou remunerações, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) das quantias distribuídas ou pagas indevidamente;”
Da análise do artigo se depreende que o § 1º, inciso I, está dizendo que as pessoas que distribuírem ou pagarem “bonificações ou remunerações” (o texto não fala em distribuição ou pagamento de dividendos) estarão sujeitas à multas. Vale dizer, continua não havendo proibição quanto à distribuição de dividendos e lucros.
Contudo, não foi assim que o STJ e a União Federal interpretaram a norma legal.
Em um caso em que uma pessoa jurídica fez parcelamento e distribuiu lucros, a União Federal se insurgiu contra a distribuição alegando que o artigo 32 da Lei nº 4.357/1965 prevê a proibição de distribuição dos lucros às pessoas jurídicas com débitos não garantidos para com o Fisco.
Por sua vez, o STJ corroborou o entendimento da União de que o artigo 32 da Lei n.º 4.357/65 proíbe as pessoas jurídicas com débitos não garantidos para com o Fisco de distribuírem lucros e dividendos, mas como no caso a empresa tinha aderido a um parcelamento, o STJ entendeu que a pessoa jurídica não poderia ser impedida de distribuir lucros e dividendos por força do parcelamento (REsp 1115136/SC, Rel. Ministro Castro Meira, 2ª Turma, DJe 23/04/2012).
Muito embora o STJ tenha autorizado a distribuição de lucros, no caso analisado, pois havia um parcelamento feito pelo contribuinte, este julgamento criou um perigoso precedente quanto à interpretação do artigo 32 da Lei nº 4.357/64, no sentido de que este dispositivo veda a distribuição de dividendos e lucros para as empresas em débito com o fisco.
Esta interpretação está completamente equivocada, pois conforme mencionado, (i) houve veto expresso do presidente da república quanto a proibição da distribuição de dividendos e (ii) o parágrafo primeiro, inciso I do artigo 32 trata da proibição da distribuição de bonificações e remunerações, nada dispondo sobre dividendos e lucros.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.