O CARF analisou a seguinte operação:
A empresa “A” alienou sua participação acionária na empresa “B”. Quando da realização do negócio, a empresa “B”, alienada, estava discutindo judicialmente exigência de ICMS sendo que o referido imposto estava com a exigibilidade suspensa.
Na negociação, a empresa vendedora “A” assumiu os encargos tributários de “B” incorridos durante o período em que era sua controladora e que viessem a se tornar exigíveis. Vale dizer a empresa “A” assumiu o passivo incorrido no período em que lhe pertencia a participação acionária.
Esse tipo de avença é extremamente comum e se destina a viabilizar a venda de empresas. Após alguns anos da concretização do negócio, o ICMS que estava sendo discutido pela alienada “B” foi confessado e incluído em parcelamento, passando a ser devido.
Em vista disso a empresa “A” considerou o valor desembolsado despesa dedutível, por ela incorrida, independentemente de ter vendido sua posição acionária. A despesa foi glosada pela fiscalização.
Na sua defesa, a empresa “A” alegou que no momento em que ocorreu a confissão da dívida tributária de ICMS e a inclusão dos valores no parcelamento, incorreu definitivamente na despesa e adquiriu o direito de deduzi-la do lucro real e da base de calculo da CSLL, na medida em que definitivamente exigível.
A DRJ/São Paulo I, que julgou o processo em primeira instância administrativa, entendeu que, na realidade, se tratava de ICMS de terceiro e, portanto, tal dispêndio não seria dedutível, destacando que o art. 123 do CTN estabelece que as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas ao Fisco.
Contudo, o CARF modificou a decisão da DRJ/SP e deu provimento ao recurso do contribuinte.
Segundo o voto vencedor do Conselheiro Marcos Shigueo Takata “faz todo o sentido, na lógica econômica e negocial, que o alienante assuma os passivos que venham a se materializar ou a se tornar exigíveis, após a transferência do investimento, mas referentes ao período em que a participação societária pertencia ao alienante, ou seja, incorridos durante esse período. São despesas normais e necessárias”.
Explicou ainda, que o passivo correspondente ao valor dos encargos tributários da empresa “B” assumidos pela “A” não tem relação com despesas de tributos, mas trata-se de despesas “particulares” (em oposição a despesas de tributos) decorrentes da negociação na venda da participação acionária.
Ainda, segundo a decisão, não se trata de alterar a sujeição passiva do tributo, mas de despesa de outra natureza decorrente de um negócio juridicamente conhecido como “assunção de adimplemento” ou “promessa de liberação”, e não uma assunção de dívida tributária, pois o devedor, perante o Fisco, continua sendo de “B”.
Em vista disso, deu provimento ao recurso do contribuinte.Segue a ementa do julgado:
“NULIDADE. INOCORRÊNCIA. NOVOS FATOS ADUZIDOS PELA CONTRIBUINTE NA FASE CONTENCIOSA. DEVIDA APRECIAÇÃO PELA AUTORIDADE JULGADORA. Se o contribuinte apresenta elementos na fase contenciosa que não foram disponibilizados à autoridade autuante na fase inquisitória, não obstante as intimações realizadas no decorrer da ação fiscal, não há que se falar em inovação quando a autoridade julgadora aprecia os novos fatos e toma a decisão com base na legislação tributária de regência. EXCLUSÃO DE REVERSÃO DE PROVISÃO. ASSUNÇÃO DE ENCARGOS TRIBUTÁRIOS DE TERCEIRO. ART. 123 DO CTN. ART. 344 DO RIR/99. O art. 123 do CTN não se presta a tornar indedutíveis despesas com assunção de encargos tributários de outro contribuinte, a qual é uma convenção particular. Se fosse isso, não haveria necessidade nem sentido para o parágrafo único do art. 116 do CTN. São despesas negociais, que não têm ponto com o art. 344 do RIR/99. Faz todo sentido, na lógica econômica, que o alienante assuma os passivos que se tornem exigíveis, após a transferência do investimento, mas referentes ao período em que a participação societária pertencia ao alienante. São despesas normais e necessárias. Paralelismo com a responsabilização civil por vícios redibitórios pelo vendedor da coisa”. (CARF – Primeira Seção, 1ª Câmara/ 3ª Turma Ordinária, acórdão: 1103-001.143, publicado em 02/04/2015).
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.