A lei anti corrupção – Lei nº 12.846/2013 – que entra em vigor hoje, trata da responsabilidade objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. A lei não trata da responsabilidade criminal.
A lei se aplica às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente (art. 1º)
Os atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, são aqueles que prejudicam o patrimônio público nacional ou estrangeiro, e que são contrários aos princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Neste aspecto, a lei é muito abrangente, pois engloba desde um “pequeno agrado” oferecido ao agente público para obter um favor, passa pelas fraudes cometidas em licitação e atinge os que praticam, e os que financiam o ato ilícito. A lei os lista da seguinte forma:
I – prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada;
II – comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos praticados contra administração pública;
III – comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados;
IV – no tocante a licitações e contratos:
a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;
b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público;
c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo;
d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;
e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo;
f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou
g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública;
V – dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.
A responsabilidade é objetiva
Um dos aspectos mais importante e que chama a atenção é que a lei menciona que a responsabilidade é objetiva, o que significa que basta ocorrer uma lesão à administração, um dano ao erário público que resulte um benefício para a pessoa jurídica, para que esta seja responsabilizada. Não é preciso ficar provado que ocorreu culpa ou a intenção de praticar a lesão (dolo). Vale dizer, mesmo que a sociedade tenha tomado precauções, mesmo que não tido a intenção de praticar qualquer ato lesivo, mesmo assim ela será responsabilizada (art. 2º).
Responsabilidade das controladoras, controladas, coligadas e consorciadas
As sociedades controladoras, controladas, coligadas, as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos, restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado.
Além disso, a responsabilidade da pessoa jurídica continua mesmo na hipótese de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária. Nas hipóteses de fusão e incorporação, a responsabilidade da sucessora será restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido.
Responsabilidade dos dirigentes e administradores
A responsabilidade também pode atingir os dirigentes, administradores, ou qualquer outra pessoa que participe do ato ilícito. Mas aqui há uma diferença. A lei menciona que a responsabilidade dos dirigentes é relacionada à sua culpa. Em outras palavras, diferente da responsabilidade da sociedade, que é objetiva e não precisa ser provada, a responsabilidade dos administradores é subjetiva, precisa ser provada que houve culpa ou dolo do envolvido.
Penas que são previstas na lei
Além da obrigação de reparar integralmente o dano causado, na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos as seguintes sanções:
I – multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; e caso não seja possível utilizar o critério do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais).
II – em caso de condenação será publicada a decisão condenatória em meios de comunicação de grande circulação.
Além de todas estas sanções, a pessoa jurídica poderá também ser responsabilizada na esfera judicial.
Mas a responsabilização da pessoa jurídica infratora não para neste ponto. As empresas que praticarem os atos lesivos relacionados acima, poderão ainda ser acionados pela União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, para que sejam aplicadas das seguintes sanções:
I – perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
II – suspensão ou interdição parcial de suas atividades;
III – dissolução compulsória da pessoa jurídica;
IV – proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.