Tributário nos Bastidores

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STJ: O arrematante de imóvel em leilão não responde pelo IPTU anterior à arrematação

O arrematante de imóvel em leilão não responde pelo IPTU anterior à arrematação.
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Esse é o entendimento do Superior  Tribunal de Justiça, ao julgar recurso repetitivo, Tema 1.134, REsp n. 1.914.902/SP.

Além disso, segundo o STJ, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação.

E isso porque, o art. 130 caput e parágrafo único, do CTN, possuem as seguintes redações:

“Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.

Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço. “

De acordo com a norma, os créditos relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade são abatidos do preço quando arrematados em hasta pública pelo arrematante. Em vista disso, o comprador não é responsável pelo IPTU que recaia sobre o bem até a data da realização da hasta.

Os valores devidos de IPTU são garantidos pelo bem imóvel e, posteriormente, passam a ser garantidos pelo preço da arrematação. Vale dizer, o adquirente (arrematante) recebe o imóvel desonerado dos ônus tributários devidos até a data da realização da hasta.

Em outras palavras, se o preço obtido na arrematação em hasta pública não for bastante para cobrir o valor do IPTU devido, não fica o arrematante responsável pelo eventual saldo devedor. A arrematação tem o efeito de eliminar os débitos que recaem sobre o bem imóvel arrematado.

O valor cobrado pelo fisco deve ser abatido do pagamento, quando do leilão, por isso que, finda a arrematação, não se pode atribuir ao arrematante qualquer encargo ou responsabilidade tributária.

Além disso, os valores de IPTU que vencerem entre a data da arrematação e a expedição da carta de arrematação, não são de responsabilidade do arrematante, por falta de lei nesse sentido.

Eis a ementa do julgado:

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA DE NATUREZA REPETITIVA. ALIENAÇÃO JUDICIAL. RESPONSABILIDADE DO ADQUIRENTE PELOS TRIBUTOS INCIDENTES SOBRE O IMÓVEL NA DATA DA ARREMATAÇÃO. INEXISTÊNCIA. SUB-ROGAÇÃO NO PREÇO. ART. 130, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CTN. PREVISÃO DOS DÉBITOS FISCAIS E DA RESPONSABILIDADE DO ARREMATANTE NO EDITAL DO LEILÃO. IRRELEVÂNCIA. NORMA GERAL DE DIREITO TRIBUTÁRIO. MATÉRIA SOB RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. APLICAÇÃO DA TESE AOS LEILÕES CUJOS EDITAIS SEJAM PUBLICIZADOS APÓS A PUBLICAÇÃO DA ATA DE JULGAMENTO DO TEMA REPETITIVO, RESSALVADAS AS AÇÕES JUDICIAIS OU OS PEDIDOS ADMINISTRATIVOS PENDENTES DE JULGAMENTO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.

I .Trata-se, na origem, de ação ordinária objetivando a declaração de inexigibilidade, em relação ao arrematante, dos débitos de IPTU incidentes sobre imóvel alienado em hasta pública, cujos fatos geradores ocorreram anteriormente à data da arrematação. A sentença reconheceu a ausência de responsabilidade tributária do arrematante e julgou procedente o pedido. Em sede de apelação, o Tribunal de Justiça ratificou o entendimento de que, adquirido o imóvel em hasta pública, inexiste responsabilidade do arrematante pelos tributos pretéritos incidentes sobre o bem, sendo irrelevante previsão no edital em sentido contrário, dada a prevalência do Código Tributário Nacional.

II. O tema em apreciação foi submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, nos termos dos arts. 1.036 a 1.041 do CPC/2015, e assim delimitado: “Responsabilidade do arrematante pelos débitos tributários anteriores à arrematação, incidentes sobre o imóvel, em consequência de previsão em edital de leilão (Tema 1.134)”.

III. Conforme o art. 146, inciso III, da CF/88, as normas gerais que versem sobre matéria tributária, dentre as quais se incluem a responsabilidade tributária, estão sujeitas à reserva de lei complementar. O Código Tributário Nacional, recepcionado com status de lei complementar, dedicou capítulo específico para tratar do tema, discorrendo sobre suas modalidades e esclarecendo que a lei poderá atribuir à terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, a responsabilidade pelo pagamento do crédito tributário (art. 128, caput, do CTN).

IV. Especificamente em relação à responsabilidade dos sucessores, o caput do art. 130 do Código Tributário Nacional previu que, ressalvada a prova de quitação, o terceiro que adquire imóvel passa a ter responsabilidade pelos impostos, taxas ou contribuições de melhorias devidas anteriormente à transmissão da propriedade. Caso a aquisição ocorra em hasta pública, o parágrafo único excepciona a regra para estabelecer que o crédito tributário sub-rogar-se-á no preço ofertado. Em que pesem as elucidativas disposições normativas constantes do Código Tributário Nacional, tornou-se praxe nos leilões realizados pelo Poder Judiciário previsão editalícia atribuindo ao adquirente do bem o ônus pela quitação das dívidas fiscais pendentes.

V. A partir de uma interpretação sistemática do Ordenamento Jurídico, extrai-se que a distinção de tratamento entre a hipótese prevista pelo caput e a tratada no parágrafo único do art. 130 do CTN levou em conta o modo de aquisição da propriedade, da doutrina civilista. Na alienação comum, a aquisição do domínio ocorre de forma derivada, transmitindo-se, além do bem, os vícios, ônus ou gravames incidentes sobre ele (obrigação propter rem). Tem-se em vista a relação de causalidade existente entre a propriedade do transmitente e a sua aquisição pelo adquirente. Já na alienação judicial inexiste tal relação jurídica, visto que a aquisição do domínio é feita sem intermediação entre o proprietário anterior e o terceiro arrematante, concretizando-se de forma direta, originária. Isenta-se, por consequência, o arrematante de quaisquer ônus que eventualmente incidam sobre o bem. Nesses termos, adquirido um imóvel mediante alienação comum, a sub-rogação da dívida fiscal será pessoal, recaindo sobre a figura do adquirente, ao passo que na alienação judicial a sub-rogação do crédito terá natureza real, operando-se sobre o próprio preço da arrematação.

VI. Além das hipóteses já previstas pelo Código Tributário Nacional, a atribuição de responsabilidade a terceiro depende de previsão em lei complementar e da existência de vínculo entre o terceiro e o fato gerador da obrigação (art. 146, inciso III, da CF/88 c.c. o art. 128, caput, do CTN). A falta de liame entre o arrematante do bem e o fato gerador da obrigação tributária não permite a inclusão desse terceiro no polo passivo da relação jurídico-tributária, quanto o mais por simples previsão no edital do leilão judicial.

VII. Frente à previsão do Código de Processo Civil de que o edital da hasta pública deve mencionar os ônus incidentes sobre o bem a ser leiloado (art. 686, inciso V, do CPC/73 e art. 886, inciso VI, do CPC/15), o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o conteúdo do art. 130, parágrafo único, do CTN, deveria ser afastado quando houvesse expressa previsão no edital imputando responsabilidade tributária ao arrematante, caso em que haveria sub-rogação pessoal, e não real, do crédito tributário.

VIII. Necessário considerar, todavia, que, ao especificar o conteúdo mínimo do edital da hasta pública, o Código de Processo Civil (art. 686 do CPC/73 e art. 886 do CPC/2015) não atribuiu, sequer implicitamente, responsabilidade tributária ao arrematante, como também não poderia fazê-lo. A teor do art. 146, inciso III, alínea b, da CF/88, lei ordinária, notadamente a de natureza processual, não se presta para disciplinar norma geral de direito tributário, que se sujeita à reserva de lei complementar.

IX. Por se tratar de um ramo do Direito Público, o arcabouço normativo que disciplina o Direito Tributário possui natureza cogente, impondo claros e expressos limites à autonomia da vontade (art. 123, do CTN). Portanto, a prévia ciência e a eventual concordância, expressa ou tácita, do arrematante, em assumir o ônus das exações que incidam sobre o imóvel, não têm aptidão para configurar renúncia à aplicação do parágrafo único do art. 130 do CTN. Em observância ao regime jurídico de direito público, as normas gerais de direito tributário, entre as quais se inclui a responsabilidade tributária, devem ser tratadas como tal, não podendo sofrer flexibilização por meros atos administrativos, estes sim, sujeitos ao controle de legalidade.

X.Do mesmo modo, como a responsabilidade tributária decorre de lei, não pode o edital da praça alterar o sujeito passivo da obrigação tributária, quer para criar nova hipótese de responsabilidade, quer para afastar previsão de irresponsabilidade, sob pena de afronta aos arts. 146, inciso III, alínea b, da CF/88 e 97, inciso III, 121, 128 e 130, parágrafo único, do CTN. Portanto, à luz dos conceitos basilares sobre hierarquia das normas jurídicas, não é possível admitir que norma geral sobre responsabilidade tributária, prevista pelo próprio CTN, cujo status normativo é de lei complementar, seja afastada por simples previsão editalícia em sentido diverso.

XI.A partir da interpretação sistemática da legislação tributária, conclui-se que: i) a aquisição da propriedade em hasta pública ocorre de forma originária, inexistindo responsabilidade do terceiro adquirente pelos débitos tributários incidentes sobre o imóvel anteriormente à arrematação, por força do disposto no parágrafo único do art. 130 do CTN; ii) a aplicação dessa norma geral, de natureza cogente, não pode ser excepcionada por previsão no edital do leilão, notadamente porque o referido ato não tem aptidão para modificar a definição legal do sujeito passivo da obrigação tributária; iii) é irrelevante a ciência e a eventual concordância, expressa ou tácita, do participante do leilão, em assumir o ônus pelo pagamento das exações que incidam sobre o imóvel arrematado, não configurando renúncia tácita ao disposto no art. 130, parágrafo único, do CTN; e iv) em atenção à norma geral sobre responsabilidade tributária trazida pelo art. 128 do CTN e à falta de lei complementar que restrinja ou excepcione o disposto no art. 130, parágrafo único, do CTN, é vedado exigir do arrematante, com base em previsão editalícia, o recolhimento dos créditos tributários incidentes sobre o bem arrematado cujos fatos geradores sejam anteriores à arrematação.

XII. Tese jurídica firmada: Diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação.

XIII. Com amparo nos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, o Código de Processo Civil de 2015 inovou ao prever a possibilidade de modulação dos efeitos das decisões que alteram jurisprudência dominante dos Tribunais Superiores. Essa é justamente a hipótese dos autos, em que se propõe a alteração da orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça há longa data. Tendo em vista que se trata de matéria que envolve a identificação de quais sujeitos a Fazenda Pública poderá se insurgir para a cobrança de dívida fiscal incidente sobre o imóvel leiloado, com reflexos na arrecadação de recursos públicos, assim como os incontáveis leilões judiciais cujo edital atribuiu responsabilidade, direta ou subsidiária, ao arrematante, impõe-se a modulação dos efeitos desta decisão. Por aplicação analógica do art. 1.035, § 11º, do CPC/2015, a tese repetitiva ora fixada deverá ser aplicada aos leilões cujos editais sejam publicizados após a publicação da ata de julgamento do tema repetitivo, ressalvadas as ações judiciais ou pedidos administrativos pendentes de julgamento, em relação aos quais a aplicabilidade é imediata.

XIV. Caso concreto: recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.

Recurso julgado sob a sistemática dos recursos especiais representativos de controvérsia (art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do RISTJ).” (REsp n. 1.914.902/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, julgado em 9/10/2024, DJe de 24/10/2024.)

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