O STF em 19/10/2016, quando do julgamento com força de repercussão geral de um recurso oriundo do Estado de Minas Gerais – RE 593849-MG – acolheu a tese de que é devida a restituição da diferença do imposto sobre circulação de mercadoria e serviços – ICMS, pago a mais no regime de substituição tributária para frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida.
No que se refere ao Estado de São Paulo, a legislação paulista tinha previsão no inciso II do art. 66-B da Lei 6.374/89, que autorizava o sujeito passivo ser restituído nos casos em que a base de cálculo efetiva para o cálculo do ICMS fosse inferior à presumida, na sistemática de substituição para frente, in verbis:
“Artigo 66-B – Fica assegurada a restituição do imposto pago antecipadamente em razão da substituição tributária: (NR)
I – caso não se efetive o fato gerador presumido na sujeição passiva; (NR)
II – caso se comprove que na operação final com mercadoria ou serviço ficou configurada obrigação tributária de valor inferior a presumida.
Contudo, o governador de SP não estava feliz com essa norma, razão pela qual o inciso II foi objeto de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade ADI 2.777 ajuizada e 02/12/2002 pelo Governador do Estado de São Paulo.
No entanto, o STF em consonância com o julgamento do RE 593.849/MG e na mesma data, julgou a ADI 2777 de SP improcedente o pedido do governador.
Como se vê, em ambos os julgamentos (RE 593.849/MG e ADI 2777 de SP) o STF assentou a seguinte premissa: caso não ocorra o fato gerador no valor presumido, o Estado tem o dever de restituir o montante pago a maior, por não ter competência constitucional para a retenção da diferença, sob pena de violação ao princípio constitucional da vedação ao confisco.
Contudo, após o ajuizamento da ADI 2777-SP que ocorreu em 2002, o Estado de São Paulo criou restrição ao o inciso II do art. 66-B da Lei 6.374/89. De fato, foi acrescentado ao art. 66-B da Lei 6.374/89, o §3º pela Lei nº 13.291, de 22/12/2008. De se salientar que esse §3º NÃO FOI ANALISADO PELO STF, POIS POSTERIOR AO AJUIZAMENTO DA ADI (a ADI 2777 foi ajuizada em 2002 e o § 3º acrescentado em 2008). Eis o teor do §3º:
“Artigo 66-B – Fica assegurada a restituição do imposto pago antecipadamente em razão da substituição tributária:
(…)
II – caso se comprove que na operação final com mercadoria ou serviço ficou configurada obrigação tributária de valor inferior a presumida.
(…)
Parágrafo 3º – O disposto no inciso II do “caput” deste artigo aplica-se apenas na hipótese de a base de cálculo do imposto devido por substituição tributária ter sido fixada nos termos do “caput” do artigo 28.
E o artigo 28 da lei 6.374.89 tem o seguinte teor:
“Artigo 28 – No caso de sujeição passiva por substituição, com responsabilidade atribuída em relação às operações ou prestações subseqüentes, a base de cálculo será o preço final a consumidor, único ou máximo, autorizado ou fixado por autoridade competente”.
Assim, nos termos do §3º do art. 66-B da Lei 6.374/89 a restituição do imposto pago antecipadamente em razão da substituição tributária caso a operação final com mercadoria ficar configurada como obrigação tributária inferior à presumida, somente se dará se a base de cálculo da substituição tributária for estabelecida com base no preço final a consumidor, único ou máximo, autorizado ou fixado por autoridade competente.
Em vista disso, o Estado de São Paulo, somente estava admitindo o ressarcimento do ICMS nessa hipótese. Na hipótese em que a base de cálculo era estabelecida com base em outros critérios, o Estado de São Paulo, não ressarcia os contribuintes.
Óbvio que o § 3º do art. 66-B da Lei 6.374/89 é incompatível com a decisão proferida pelo STF no RE 593.849/MG, pois o direito constitucional à restituição foi reconhecido em todas as hipóteses se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida.
Isso gerou milhares de ações no Judiciário de SP e o TJSP tem decidido que a condição estabelecida pelo art. 66-B, § 3º, incluído pela Lei 13.291/08 que limita o direito à restituição e é incompatível com o decidido no RE 593.849/MG.
Em vista desses acontecimentos em 13.12.2018 foi publicado o “Comunicado CAT Nº 14 DE 12/12/2018” emitindo novo esclarecimento sobre o ressarcimento do ICMS devido por substituição tributária, em face das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 593.849 e na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.777.
Segundo esse Comunicado, o Estado de SP vai ressarcir os ICMS em todas as hipóteses, desde “19.10.2016, data em que foram tornadas públicas as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, sendo admitido também pedido de ressarcimento referente a casos pretéritos que já estavam em trâmite judicial na referida data”.
Eis os termos do Comunicado CAT Nº 14 DE 12/12/2018:
“Considerando o disposto nas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 593.849 e na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.777;
Considerando que é competência da PGE/SP, dentre outras, definir, previamente, a forma de cumprimento de decisões judiciais e promover a uniformização da jurisprudência administrativa e da interpretação das normas, tanto na Administração Direta como na Indireta, conforme artigo 3º, incisos XI e XIII, da Lei Complementar estadual 1.270/2015, Comunica que, conforme manifestação complementar da PGE/SP, depois do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.777 e do Recurso Extraordinário 593.849, ficou sedimentado o entendimento de que o artigo 66-B , II, da Lei 6.374/1989 , julgado constitucional sem qualquer menção ao seu novo § 3º, deve ser aplicado pela Administração.
Para o ressarcimento do ICMS pago antecipadamente pelo regime de substituição tributária, em decorrência de hipótese prevista no artigo 66-B , II, da Lei 6.374/1989 , será admitido pedido referente a período posterior a 19.10.2016, data em que foram tornadas públicas as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, sendo admitido também pedido de ressarcimento referente a casos pretéritos que já estavam em trâmite judicial na referida data.
Os pedidos de ressarcimento devem observar a disciplina estabelecida pela Portaria CAT 42 , de 21.05.2018”.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.