Nos termos do artigo 311, II do CPC a tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante.
Direito evidente é aquele que pode ser comprovado de plano, sem deixar incertezas ao julgador, muito similar ao direito líquido e certo do mandado de segurança. A sua evidência e probabilidade é enorme e, por essa razão, não faz sentido deixar que o autor espere o final do processo para dar-lhe a tutela definitiva.
Pois bem, nos dias de hoje é extremamente comum, no direito tributário, haver tese firmada com base em casos repetitivos ou em súmulas vinculantes, assim a tutela de evidência pode ser largamente usada na esfera tributária.
Quando julgou sob o sistema da repercussão geral, que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins, o STF firmou a seguinte tese: O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS.
Com base na tese firmada e com fundamento na tutela antecipada de evidência, os contribuintes podem pedir junto ao Poder Judiciário, a compensação imediata dos valores indevidamente pagos a título de PIS e Cofins sobre o ICMS.
Não se olvida que o artigo 170-A do CTN estabelece que “É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial”.
Contudo, conforme explica Luiz Guilherme Marinoni:
“A tutela antecipatória produz o efeito que somente poderia ser produzido ao final (trânsito em julgado). Um efeito que, por óbvio, não descende de uma eficácia que tem a mesma qualidade da eficácia da sentença. A tutela antecipatória permite que sejam realizadas antecipadamente as conseqüências concretas da sentença de mérito. Essas conseqüências concretas podem ser identificadas com os efeitos externos da sentença, ou seja, com aqueles efeitos que operam fora do processo e no âmbito das relações de direito material.
“Note-se, além disso, que no caso de tutela antecipatória mediante julgamento antecipado de parcela do pedido ou de um dos pedidos cumulados, não há produção imediata de um efeito que somente poderia ser produzido pela sentença de mérito, mas apenas a antecipação do momento em que deveria ser proferido o julgamento do pedido, compreendido este momento como o final do processo, ou seja, aquele em que todos os pedidos cumulados (ou a integralidade do pedido) estão maduros para julgamento. (in Antecipação da tutela. 12ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p.44.)
Vale dizer, a antecipação da tutela outorga ao julgador o poder de antecipar a realização do direito. Com esse instrumento, o julgador pode ultrapassar o óbice do artigo 170-A do CTN, permitindo a compensação com o aproveitamento imediato do tributo pago indevidamente pelo sujeito passivo.
Nesse sentido, transcrevo a decisão proferida pelo Juiz Federal Rogério Tobias De Carvalho Titular da 28ª Vara do Rio de Janeiro, na Ação Ordinária nº 0030990-09.2017.4.02.5101 (2017.51.01.030990-0)
“Embora o artigo 170-A do CTN não permita a compensação de créditos tributários antes do trânsito em julgado da decisão que a tiver determinado (Súmula 212/STJ) nada impede que decisão judicial possa afastar eventuais óbices ilegais e/ou abusivos do fisco, que impeçam o contribuinte de pleitear a compensação administrativamente, conforme prevê a legislação tributária. No caso, a decisão judicial não extingue o crédito tributário, nos termos do artigo 156, II, do CTN, a qual ainda dependerá de valoração da autoridade fiscal no âmbito administrativo, mas declarará sua compensabilidade (na mesma linha da Súmula 213/STJ).
Assim, entendo possível a declaração de possibilidade de compensação, antes mesmo do trânsito em julgado, dos valores recolhidos indevidamente com débitos vincendos de quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, nos termos da Instrução Normativa RFB 1.300/2012, a qual regulamentou o disposto no artigo 74 da Lei 9.430/1996:
“Art. 41. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive o crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo administrado pela RFB, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela RFB, ressalvadas as contribuições previdenciárias, cujo procedimento está previsto nos arts. 56 a 60, e as contribuições recolhidas para outras entidades ou fundos.
- 1º A compensação de que trata o caput será efetuada pelo sujeito passivo mediante apresentação à RFB da Declaração de Compensação gerada a partir do programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, mediante a apresentação à RFB do formulário Declaração de Compensação constante do Anexo VII a esta Instrução Normativa, ao qual deverão ser anexados documentos comprobatórios do direito creditório.
- 2º A compensação declarada à RFB extingue o crédito tributário, sob condição resolutória da ulterior homologação do procedimento.”
A ressalva contida no artigo 41 acima transcrita, que excepciona as contribuições previdenciárias, não se aplica ao caso concreto, pois não será observado o procedimento próprio previsto nos artigos 56 a 60 da mesma Resolução 1.300/2012. Estas referidas contribuições são aquelas que incidem apenas sobre a folha de salários, e que observam rotina fiscal própria para compensação (GFIP).
Não faria o mínimo sentido afastar a exigibilidade do PIS e da COFINS (parcialmente) e não permitir que o contribuinte compensasse seus indébitos com tributos da mesma natureza e espécie. Desde a vigência do artigo 66 da Lei 8.383/1991 já se permitia a compensação entre tributos da mesma espécie.
Sobre as parcelas a serem compensadas incidirá a taxa selic a partir de cada pagamento indevido, e 1% no mês onde estiver sendo efetuada a compensação, nos termos do artigo 39, parágrafo 4º, da Lei 9.250/95.
ANTE O EXPOSTO, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela para AFASTAR da base de cálculo do PIS e da COFINS os valores referentes ao imposto estadual ICMS suportado pela AUTORA, e SUSPENDER a exigibilidade dos créditos tributários a tal título.
DECLARO provisoriamente ainda o direito de a AUTORA compensar os valores que recolheu a mais a tal título, desde os últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, com quaisquer tributos arrecadados pela SRFB, com exceção das contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários, corrigido pela taxa selic, nos termos dos artigos 74 da Lei 9.430/1996, 41 da Resolução 1.300/2013, súmulas 212 e 213 do STJ; bem como artigo 39, parágrafo 4º, da Lei 9.250/95”.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.