Existem diversos incentivos fiscais concedidos pelos Estados, ou mesmo pela União Federal, chamados “créditos presumidos” e afetam a carga tributária reduzindo-a. Os mais comuns são os créditos presumidos de IPI e créditos presumidos de ICMS.
Nesse post será dado destaque aos créditos presumidos de ICMS, que são créditos fictícios lançados na escrita fiscal que resultam em diminuição ou anulação da carga tributária da mercadoria. Não são originados pelas entradas de mercadorias tributadas pelo ICMS. Consubstanciam-se em uma presunção de crédito do imposto estadual sobre valores apurados com substrato nas operações realizadas pelo contribuinte.
Grande parte dos créditos presumidos de ICMS têm natureza jurídica de subvenções. O termo subvenção é originário do latim “subventione” e significa ajuda outorgada por entes públicos em caráter suplementar. Por meio das subvenções o Poder Público incentiva determinadas atividades que tem interesse em fomentar. Apesar de ser uma liberalidade, sua outorga se dá em vista do cumprimento de uma finalidade que é de interesse geral.
A atividade do estado em conceder subvenções é decorrente da sua função administrativa e encontra fundamento na supremacia do interesse público sobre o particular e da indisponibilidade do interesse público. Ou seja, é uma atividade caracterizada pela outorga de vantagens e benefícios aos particulares que atuam de acordo com o desejo estatal, e por causa de sua opção recebem um tratamento especial.
Modesto Carvalhosa ensina que as subvenções são “ajudas ou auxílios pecuniários, concedidos pelo Estado, em favor de instituições que prestam serviços ou realizam obras de interesse público.” (Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. 3, São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, p. 603).
Vale dizer, a subvenção é uma ferramenta à disposição do Poder Público utilizada para incentivar algumas atividades ou empreendimentos vinculados ao interesse público. Objetiva promover o estímulo de alguns setores econômicos ou regiões do país. Subdividem-se em (i) subvenções correntes para custeio ou subvenções para operação (expressões sinônimas) e (ii) subvenções para investimento.
Subvenções para investimento são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la na aplicação em bens ou direitos para implantar ou expandir empreendimentos econômicos (PN CST 112/78). São direcionadas para a expansão da empresa para implementar o parque industrial, e também, para o desenvolvimento de novas atividades econômicas. Vale dizer, visam incentivar setores econômicos ou regiões em cujo desenvolvimento haja interesse especial.
Subvenções correntes para custeio são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la a fazer face ao seu conjunto de despesas, nas suas operações (PN CST 112/78), tem por finalidade compensar despesas operacionais.
Pouco importa a forma com que as subvenções são concedidas, se por meio de créditos presumidos, ou por outra forma, o que importa é a finalidade pela qual ela é concedida. O escopo da subvenção sempre estará definido no instrumento legal que a concede.
A distinção entre subvenção para custeio e subvenção para investimento é importantíssima, pois, nos termos da legislação tributária, sobre as segundas não incide IRPJ e CSLL.
De fato, nos termos do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, artigo 38, § 2º, na redação original, as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos concedida como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações não serão computadas na determinação do lucro real.
Atualmente a matéria é tratada pelo artigo 19, inciso V do Decreto-lei nº 1598/77, na redação da Lei 12.973/2014, que estabelece que considera-se lucro da exploração o lucro líquido do período-base, ajustado pela exclusão das subvenções para investimento, inclusive mediante isenção e redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, e as doações, feitas pelo poder público.
Assim, de acordo com a lei, toda vez que o crédito presumido de ICMS tenha por finalidade aplicação na aquisição de bens ou direitos necessários à implantação ou expansão de empreendimento econômico deve ser classificada como de investimento e, nessa condição, não pode integrar a base de cálculo da CSLL e do IRPJ apurado pelo lucro real.
Contudo, boa parte das decisões proferidas pelo STJ partem do falso pressuposto que todo o crédito presumido de ICMS se consubstancia em subvenção para custeio e, portanto, tributável pelo IRPJ e CSLL. Isso fica claro quando se vê que os precedentes não enfrentam a natureza de cada crédito presumido e, alguns, os equipara a crédito presumido de IPI (benefício de competência federal). (Exemplo: AgRg no REsp 1448693/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 05/08/2014, DJe 12/08/2014).
No entanto, o pressuposto de que créditos presumidos de ICMS sempre são subvenção para custeio não é verdadeira, pois muitos deles podem ter natureza de subvenção para investimento (que estão fora da incidência do IRPJ e CSLL nos termos da lei) conforme reconhecido diversas vezes pelo CARF. Nesse sentido as recentíssimas decisões do Conselho:
“(…) CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS. SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. Os valores correspondentes ao benefício fiscal de redução de ICMS, decorrentes da obtenção de créditos presumidos, que possuam vinculação, ainda que indireta, com a aplicação dos recursos em bens ou direitos referentes à implantação ou expansão de empreendimento econômico, caracterizam como subvenção para investimento, podendo ser excluída na determinação do lucro real”. (Número do Processo 10480.727379/2012-49, Nº Acórdão 1402-002.043, Data da Sessão 18/01/2016)
“IRPJ. LUCRO REAL. INCENTIVOS FISCAIS. EMPRÉSTIMOS SUBSIDIADOS. CRÉDITO PRESUMIDO DO ICMS. SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. CARACTERIZAÇÃO. A concessão de incentivos à implantação de indústrias consideradas de fundamental interesse para o desenvolvimento de municípios no interior dos Estados do Ceará e da Bahia, consistentes em empréstimos subsidiados e crédito presumido de ICMS, configuram subvenções para investimento, notadamente quando presentes: i) a intenção do Poder Público em transferir capital para a iniciativa privada; ii) a verba oriunda da subvenção foi destinada para investimento na implantação de empreendimentos econômicos de interesse público; iii)) o beneficiário da subvenção é pessoa jurídica constituída sob a forma de companhia; iv) a subvenção foi registrada em conta de reserva de capital; v) ocorreu aumento de capital na pessoa jurídica subvencionada, mediante incorporação das reservas ao seu capital.
A conta de reserva de capital poderá ser utilizada apenas para absorver prejuízos ou ser incorporada ao capital social, não podendo ser distribuída. (Número do Processo 10380.012049/2009-88, Nº Acórdão 1202-000.921, julgamento em 18/01/2016)
“SUBVENÇÃO PARA INVESTIMENTO. Caracterizam subvenção para investimento e, portanto, não se sujeitam à incidência do IRPJ e da CSLL, as quantias relativas ao crédito presumido de que cuida o art. 148-A, do Anexo II, do Regulamento do ICMS do Estado de Santa Catarina” (Número do Processo 10920.724243/2012-51, Nº Acórdão
1201-001.182, Data da Sessão 24/03/2015).
Vamos esperar que a E. Corte Superior passe a analisar os créditos presumidos de ICMS caso a caso, para verificar se estes se consubstanciam em subvenção para custeio ou para investimento, para proferir suas decisões.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.