Resumo: O post trata do direito ao crédito a ser descontado do PIS e Cofins não cumulativos decorrente dos serviços aduaneiros de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, que pode ser pleiteado por meio de ação quanto ao passado (cinco anos) e ao futuro, bem como pode ser defendido em caso de autuação.
Ainda existe muito debate em relação aos custos e despesas que geram créditos de PIS e Cofins apurados pelo sistema não cumulativo.
Em relação ao PIS e à COFINS o conceito de insumo se relaciona com a receita auferida, visto que esta é base de incidência destas contribuições, diferente da base de incidência do IPI e ICMS, impostos que têm relação íntima com o produto e mercadoria, respectivamente. Isto leva à conclusão que o conceito de insumo, para fins de IPI e ICMS é mais limitado do que o conceito de insumo para fins de desconto de créditos de PIS e COFINS.
Em vista disso, devem ser considerados insumos para fins das contribuições todos os bens e serviços que são imprescindíveis para: (i) produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda; (ii) prestação de serviços e que possibilitarão o auferimento de receita. Vale dizer, todos os recursos indispensáveis à prestação de serviços, produção e à venda de bens que acabarão por gerar receitas, exceto aqueles cujo aproveitamento está vedado em lei, se consubstanciarão em créditos de PIS e da COFINS.
Disto se extrai que o creditamento de PIS e COFINS deve ser avaliado em cada caso. A pessoa jurídica deve analisar sua atividade específica e identificar os bens e serviços necessários ao processo que resulta na fabricação ou produção e comercialização de bens e produtos ou prestação de serviços, que irão gerar a receita.
Quanto aos serviços aduaneiros, o direito ao crédito se perfaz na medida em que os referidos serviços sejam (i) adquiridos de pessoa jurídica domiciliada no País e (ii) essenciais à produção integrando o processo que resulta na fabricação do produto.
Os principais serviços aduaneiros são aqueles previstos e conceituados no artigo 40, § 1o e incisos da Lei nº 12.815 de 5 de junho de 2013 e se consubstanciam em serviços de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados. A lei conceitua como:
I – capatazia: atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário;
II – estiva: atividade de movimentação de mercadorias nos conveses ou nos porões das embarcações principais ou auxiliares, incluindo o transbordo (transferência de mercadorias ou produtos de um para outro veículo de transporte ou embarcação), arrumação, peação (fixação da carga nos porões ou conveses da embarcação visando a evitar sua avaria pelo balanço do mar) e despeação (desfazer a peação);
III – conferência de carga: contagem de volumes, anotação de suas características, procedência ou destino, verificação do estado das mercadorias, assistência à pesagem, conferência do manifesto e demais serviços correlatos, nas operações de carregamento e descarga de embarcações;
IV – conserto de carga: reparo e restauração das embalagens de mercadorias, nas operações de carregamento e descarga de embarcações, reembalagem, marcação, remarcação, carimbagem, etiquetagem, abertura de volumes para vistoria e posterior recomposição.
Da descrição dos serviços, verifica-se que quando uma pessoa jurídica importa insumos para a fabricação de bens, ou mercadorias para revenda, os dispêndios com os serviços de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga são absolutamente necessários ao processo que resulta na fabricação ou comercialização de bens e produtos. Não pode a pessoa jurídica prescindir desses serviços, não são eles opcionais, nem atividade-meio e tampouco despesa administrativa.
A exclusão desses serviços levaria à absoluta impossibilidade da revenda ou produção de bens impedindo a atividade da pessoa jurídica. Sem esses serviços os produtos importados poderão sofrer avaria, ou se tornar imprestáveis para sua finalidade e quiçá chegar ao seu destino. Por isso são serviços essenciais intrinsecamente ligados à produção de mercadorias importadas e acabarão por gerar receitas.
Parece óbvio que para chegar ao seu destino os produtos deverão sofrer movimentação nas instalações dentro do porto, ser conferidos, transportados internamente. Não há como negar que a atividade de conferência de carga, conserto de carga, movimentação de mercadorias nos conveses ou nos porões das embarcações, a transferência de mercadorias ou produtos de um para outro veículo de transporte, que a fixação da carga nos porões ou conveses da embarcação visando a evitar sua avaria pelo balanço do mar bem como o carregamento e a descarga com equipamentos de bordo são serviços imprescindíveis ao processo que irá gerar receita e que garantirão a chegada dos bens ao seu destino sem danos ou avarias.
Ademais, do teor do § 2 º do artigo 289 do RIR 99 se depreende que os gastos com desembaraço aduaneiro integram o custo de aquisição das mercadorias revendidas e das matérias-primas utilizadas. Conforme mencionado, os custos de produção passíveis de crédito de PIS e COFINS englobam o custo de aquisição de matérias-primas e quaisquer outros bens ou serviços aplicados ou consumidos na produção, o que leva à conclusão de que os serviços aduaneiros pagos a empresas domiciliadas no país são insumos para fins de aproveitamento de crédito de PIS e COFINS não cumulativos.
Tanto isso é assim que a Solução de Consulta nº 145 de 16 de Dezembro de 2010 – DISIT 10 – decidiu que “os gastos com desembaraço aduaneiro pagos a pessoa jurídica domiciliada no País, decorrentes de importação de matéria-prima, integram o seu custo de aquisição, podendo gerar crédito a ser descontado da COFINS apurada no regime não-cumulativo”.
Contudo, este entendimento não vingou, no âmbito da Receita Federal que encontrou outro obstáculo para impedir o aproveitamento desses créditos. A Receita consolidou o entendimento de que na operação de importação de bens utilizados como insumo pela pessoa jurídica importadora, a possibilidade de desconto de créditos do PIS e da COFINS deve ser analisada à luz da Lei nº 10.865/2004, que criou o PIS/Importação e o COFINS/Importação.
Segundo o entendimento fazendário o desconto crédito previsto na Lei nº 10.865/2004 (art. 15, I e II) aplica-se apenas sobre os valores que integram o valor aduaneiro, base de cálculo do PIS/Importação e do COFINS/Importação, razão pela qual, segundo a Receita, os serviços aduaneiros mencionados não podem ser objeto de crédito.
Contudo, os créditos de PIS e COFINS calculados em relação aos serviços aduaneiros se prestados por pessoas domiciliadas no país, ao contrário do que entende a Receita Federal, não tem por fundamento a Lei nº 10.865/2004, mas as Leis nºs 10.833/2003 e 10.637/2002 (art. 3º, II, § 3º, I), que asseguram a apropriação destes como insumos na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, havendo assim amparo legal ao crédito.
Tanto é assim que o entendimento aqui defendido já foi aceito em alguns julgados CARF. Em decisões sobre o aproveitamento de créditos sobre custos com desestiva, o tribunal decidiu que o contribuinte fazia jus aos créditos apurados sobre os gastos com estes serviços, correspondentes ao descarregamento, movimentação, acondicionamento e armazenagem das matérias-primas em armazém alfandegado, pagos às pessoas jurídicas domiciliados no país.
De acordo com o CARF, nestas hipóteses os gastos com estes serviços integram o custo dos bens, e o direito do crédito é assegurado no art. 3º da Lei nº 10.637/2002 e da Lei nº 10.833/2003 (cfr. Processo nº 15586.001201/201048, Recurso nº Voluntário, Acórdão nº 3301002.061, 3ª Câmara / 1ª Turma Ordinária, Sessão de 25 de setembro de 2013 e Processo nº 11080.722811/200985, Recurso nº Voluntário, Acórdão nº 3402002.443, 4ª Câmara / 2ª Turma Ordinária, Sessão de 19 de agosto de 2014).
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.