O ICMS é um imposto estadual que incide sobre a circulação (venda) de mercadorias. Ocorre que a cadeia comercial de uma mercadoria muitas vezes começa em um Estado e termina em outro. São as chamadas operações interestaduais.
Via de regra o ciclo da mercadoria inicia no Estado onde está instalada a indústria, que posteriormente é remetida para um comerciante em outro Estado, que acaba vendendo ao consumidor final. Nesta hipótese, os dois Estados ficam com uma parte do ICMS que recai sobre aquela mercadoria, pois a venda é realizada em ambos.
Com a venda remota de mercadorias via internet, telemarketing e showroom, acontece o seguinte: os produtos que saem de um estado produtor (fabricante) acabam sendo vendidos diretamente ao consumidor final pelo próprio Estado produtor. Por exemplo, alguém que mora em Alagoas, em vez de comprar uma mercadoria de uma loja física naquele estado, compra diretamente do comerciante de São Paulo, via internet. Nesta hipótese, pelo sistema tributário brasileiro considera-se a operação equiparada a uma operação interna (operação em o ciclo da mercadoria começa e termina no mesmo estado) e o ICMS é devido apenas ao estado produtor (conforme art. 155, § 2º, VII, “b” da Constituição Federal).
Isto acarreta uma perda de arrecadação dos Estados “não produtores”.
Inconformados, alguns estados que perderam a arrecadação, no caso, o Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Rondônia, Sergipe e o Distrito Federal, sentindo-se prejudicados reuniram-se e baixaram o Protocolo ICMS nº 21, decidindo cobrar o ICMS como se a mercadoria tivesse sido também comercializada nos seus Estados, gerando um aumento da carga tributária neste tipo de operação em mais de 50%.
Este Protocolo retrata mais um episódio das chamadas guerras fiscais que os entes políticos travam entre si. Qualquer operação, ou mudança de comportamento do mercado que acarrete perda de arrecadação de algum estado, comumente gera uma reação imediata com criação de normas que geralmente violam o sistema legal tributário da forma como concebido e, via de regra, o resultado dessas guerras acaba estourando no bolso do contribuinte.
Pois bem, em vista do Protocolo 21, foram ajuizadas diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade, afirmando que esse diploma viola a CF. Contudo, nenhuma das Adins há medida liminar suspendendo a eficácia da norma e das respectivas legislações estaduais
Em vista disso uma grande empresa multinacional que realiza a comercialização de produtos remotamente por meio da internet que está na iminência de começar as suas operações no Brasil ajuizou ação declaratória contra os estados que firmaram o convênio 21 e o Estado de São Paulo, requerendo:
(i) A declaração de inconstitucionalidade do Protocolo 21;
ou em caso de se reputar o Protocolo 21 válido:
(ii) seja reconhecido o direito dos demais Estados com exceção da Fazenda do Estado de São Paulo à cobrança da diferença entre a alíquota interna e a alíquota interestadual do ICMS, caso em que a Fazenda do Estado de São Paulo deve ser condenada a tratar estas vendas como operações sujeitas ao ICMS interestadual.
Em 04/02/2014 foi publicada interessante decisão do TJSP que concedeu liminar, para ficar determinado que para as operações de e-commerce realizadas pela empresa para outros Estados, não haja a incidência da alíquota interna (cheia) do imposto, devendo o Estado de São Paulo aplicar a interestadual (Processo nº 2009501-56.2014.8.26.0000)
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.