Recentemente foi divulgado que a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o ICMS compõe a base de cálculo do IRPJ e da CSLL para as empresas optantes do lucro presumido. De acordo com notícias publicadas nos jornais, o STJ entendeu que se o contribuinte quiser deduzir os tributos pagos, deverá optar pelo regime de tributação com base no lucro real.
As notícias comentam que a Fazenda Nacional sustenta que o contribuinte não pode aproveitar as vantagens dos dois regimes, a saber, lucro real e lucro presumido, para criar um terceiro regime não previsto em lei. Ou seja, segundo a Fazenda Nacional, a não inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins no regime do lucro presumido criaria um terceiro sistema de apuração de imposto de renda que aproveitaria as vantagens do lucro real e presumido, pois poderiam haver deduções no lucro presumido.
Além disso, o ministro relator dos processos julgados, a saber REsp 1.763.582 e REsp 1.760.429, Herman Benjamin, teria destacado que, se o contribuinte quiser deduzir os tributos pagos, deverá optar pelo regime de tributação com base no lucro real. Afirmou ainda que as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pelo lucro presumido têm por parâmetro a aplicação de determinado percentual sobre a “receita bruta”, e não sobre a “receita líquida”.
Com o devido respeito a decisão do STJ está completamente equivocada porque parte de premissas equivocadas.
Após a decisão do STF no sentido de que o ICMS não integra a receita bruta do contribuinte, porque se trata de receita dos Estados, não há como continuar a incluir o ICMS na base de cálculo do lucro presumido que é a receita bruta.
De fato, o STF decidiu que o ICMS é imposto é destinado aos Estados Membros e é receita dos Estados e não dos contribuintes (Recurso Extraordinário nº 574.706-PR). Naquele julgamento o Exmo. Ministro Celso de Mello destacou no seu voto que “os valores recolhidos a título de ICMS não se subsumem à noção conceitual de receita ou de faturamento da empresa”.
Não obstante o julgado se refira à exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, o mesmo raciocínio se aplica a qualquer tributo que tenha como base de cálculo a receita bruta, qual seja, a exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurado sob o sistema do lucro presumido, que também têm por base de cálculo a receita bruta.
E isto porque “receita bruta” é conceito de Direito Comercial que de acordo com a legislação, não pode ser alterado pela legislação tributária por força do disposto no artigo 110 do CTN que estabelece: “A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”.
E obviamente no direito, o conceito dos institutos não mudam e tampouco são flexíveis. Assim, a controvérsia discutida no RE 240.785/MG e no RE 574.706 (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS) e exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL na sistemática de lucro presumido são interligadas, porque está se tratando da mesma base, qual seja, receita bruta.
Se o ICMS não integra a receita bruta, como já definiu o STF, é óbvio que não se pode falar que os contribuintes pretendem deduzir o ICMS da base de cálculo do lucro presumido, misturando os regimes de lucro real e presumido. Ora, o ICMS não integra a receita bruta para que possa ser deduzido. Somente pode ser deduzido o que já está dentro, o que não está dentro não pode ser deduzido porque não integra.
E tampouco o ICMS é despesa a ser deduzida pois, conforme também destacou o STF, o ICMS é mero ingresso na contabilidade da pessoa jurídica, porque é receita dos estados. Apenas transita na conta da empresa sem lhe pertencer. O contribuinte age com mero arrecadador do fisco estadual. Cabe a pergunta: Como pode uma receita de terceiros ser confundida com dedução ou com despesa?
Por outro lado, a não inclusão do ICMS na base de cálculo do lucro presumido (receita bruta), não a transforma em receita líquida, pois na definição do STF o ICMS não integra a receita bruta e esta continua sendo receita bruta, mesmo sem o imposto estadual.
Na verdade, ao impedir a exclusão do ICMS da base de cálculo do lucro presumido, a decisão do STJ está autorizando a tributação de IRPJ e CSLL sobre receita de terceiros, ou seja, receita dos Estados e isso sim vai contra qualquer princípio de tributação do lucro, pois se está exigindo IRPJ e CSLL sobre valores que não pertencem ao contribuinte, ou seja, sobre um não lucro e uma não renda.
Como consolo temos o fato que a discussão ainda não acabou e que poderá ser revista pelo próprio STJ e pelo STF.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.