Com base no Convênio ICMS nº 106/17, que tratou dos procedimentos de cobrança do ICMS incidente nas operações com bens e mercadorias digitais comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados, o Estado de São Paulo baixou o Decreto nº 63.099/17 determinando que a partir de 1º de abril, o ICMS será exigido sobre as operações com software realizadas por meio de transferência eletrônica de dados, sobre o valor total da operação, incluindo o valor do programa, do suporte informático e quaisquer outros valores cobrados do seu adquirente.
Além disso, o Decreto nº 63.099/17 mencionado definiu como o local de recolhimento do imposto: unidade federada onde estiver domiciliado ou estabelecido o adquirente; estabeleceu a isenção do ICMS para as operações anteriores à saída destinada ao consumidor final; elevou à condição de estabelecimento autônomo do site ou plataforma que realize as operações com software mediante transferência eletrônica; criou a obrigatoriedade de inscrição estadual nos Estados em que as empresas comercializarem o software mediante transferência eletrônica.
Ocorre software adquirido por transferência eletrônica não há suporte físico e por essa razão, há diversos juristas que entendem que não se trata de mercadoria, pois não é um bem corpóreo, vale dizer, lhe falta o corpus mechanicum, visto que o conceito de mercadoria exige a materialidade da coisa para ocorrer a sua respectiva tradição.
Por outro lado, o programa de computador (software) possue natureza jurídica de direito autoral/propriedade intelectual, além de ser bem intangível e incorpóreo. Quando um software é adquirido por um terceiro, não caracteriza uma operação de compra e venda (obrigação de dar), tampouco uma prestação de serviço (obrigação de fazer), mas tão somente uma licença de uso do mesmo.
Por essas razões o software não pode ser tratado como mercadoria, uma vez que ele nunca passa a ser da propriedade do adquirente.
Assim, ao exigir o ICMS sobre as operações com software realizadas por meio de transferência eletrônica de dados, o Decreto nº 63.099/17 passou a exigir ICMS sobre operações que não tem qualquer relação com circulação de mercadoria, e por essa razão, não há ocorrência do fato gerador do imposto.
Além disso o Decreto no 63.099/17 do Estado de São Paulo instituiu nova hipótese de incidência do ICMS, em, ofensa ao art. 146, III, “a” da Constituição Federal. E isto porque somente a lei complementar pode definir o fato gerador e a base de cálculo e contribuinte. Feriu também o princípio da legalidade tributária constante no artigo art. 150, I da Constituição Federal e art. 97 do Código Tributário Nacional, pois acabou por instituir imposto por intermédio de Decreto.
Tendo em vista esses argumentos, o SEPROSP – Sindicato das Empresas de Processamento de Dados e Serviços de Informática do Estado de São Paulo pleiteou em sede de agravo de instrumento (2065250-19.2018.8.26.0000) ao TJSP a suspensão da exigibilidade dos valores relativos ao ICMS incidente sobre as operações com software realizadas por transferência eletrônica de dados, nos termos do Decreto nº 63.099/17 do Estado de São Paulo.
Ao analisar o pedido, a 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, em acórdão relatado pelo Desembargador Marcelo Martins Berthe reformou a decisão de primeira instância para determinar a suspensão da exigibilidade dos valores relativos ao ICMS incidente sobre as operações com software realizadas por transferência eletrônica de dados, com base no Decreto Estadual n° 63.099/17.
Segue ementa do julgado:
“RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. ADMINISTRATIVO. TRIBUTÁRIO. ICMS. INCIDÊNCIA SOBRE OPERAÇÕES COM SOFTWARE. Presente a verossimilhança das alegações a determinar a suspensão da exigibilidade de ICMS incidente sobre as operações com software realizadas por transferência eletrônica de dados nos termos do Decreto n° 63.099/17. Hipótese em que se verifica suposta ilegalidade de regulamentação de ICMS pelo Decreto Estadual n° 63.099/17, com determinação de regra matriz de incidência tributária, por meio de Decreto Estadual n° 63.099/17 que observou as disposições do Convênio ICMS 106/17 editadas pelo CONFAZ e não disposição expressa em lei. Decisão de indeferimento reformada. Recurso provido” (agravo de instrumento: 2065250-19.2018.8.26.0000)
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.
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