O art. 9o da Lei nº 9.249/95 enuncia que a pessoa jurídica poderá deduzir para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio (JCP), calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata die, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP.
O efetivo pagamento ou crédito dos JCP fica condicionado à existência de lucros, computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados.
Como se vê, as normas legais admitem um regime tributário específico para os valores pagos a título de JCP, cuja dedutibilidade como despesa foi permitida para efeito de apuração do lucro real, base de cálculo do Imposto de Renda. O beneficiário dos juros, pessoa física ou jurídica, sócia, acionista ou titular de empresa individual, residente ou domiciliada no Brasil será tributado na fonte.
Pois bem, a Receita Federal entende que a observação do regime de competência é requisito para a dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio – JCP. De fato, a Receita entende que não é permitida a dedução, na apuração do lucro real, dos valores de JCP calculados com base no patrimônio líquido dos anos anteriores ao ano em que exercida a faculdade do pagamento pelo contribuinte, por falta de previsão no art. 9º da Lei nº 9.249/95 e em razão da observância ao regime de competência.
Na verdade, diversas Instruções Normativas sucessivas (IN 11 de 21/02/96, IN RFB Nº 1515, de 24/11/2014, IN RFB Nº 1700, de 14/03/2017) determinaram que os JCP podem ser pagos ou creditados sócio ou acionista da sociedade ou do titular da empresa individual, no ano-calendário da sua apuração
Contudo, esse entendimento não pode prevalecer mesmo tendo por base Instrução Normativa, pois a lei não estabelece nenhum momento específico para o pagamento dos JCP e, portanto, nada está estipulado no sentido de que a dedução de JCP deva ser feita no mesmo exercício-financeiro em que realizado o lucro da empresa. Ao contrário, da interpretação do artigo 9º da Lei 9.249/95, verifica-se que há permissão que o pagamento ou creditamento ocorra em período futuro, quando efetivamente ocorrer a realização do pagamento. Eis o teor do artigo 9º:
“Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir, para efeitos da apuração do lucro real, os juros pagos ou creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP”.
O período de competência dos JCP é aquele em que ocorre a deliberação dos sócios ou acionistas pelo seu creditamento ou pagamento. A sociedade somente assume a obrigação no momento da deliberação, que é o ato jurídico que estabelece a obrigação de pagar os juros. Enquanto esta não ocorrer, não surge a despesa, e assim, não há que se pensar em dedutibilidade de encargo que não existe.
E por não existir nenhuma proibição, a sociedade pode decidir pelo pagamento de JCP em períodos subsequentes relativos a períodos pretéritos e o não pagamento de JCP em períodos passados não significa renúncia do direito de pagá-los.
Recentemente, o TRF3 proferiu decisão favorável ao contribuinte entendendo que é possível deduzir os JCP de exercícios anteriores:
“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IRPJ E CSLL – DEDUÇÃO DOS JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO DE EXERCÍCIOS ANTERIORES. POSSIBILIDADE. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DESPROVIDAS.1. A teor do art. 9º, caput, da Lei nº 9.249/95, à pessoa jurídica é dado deduzir, da apuração do lucro real, os juros pagos aos sócios e aos acionistas a título de remuneração sobre capital próprio, prevendo em seu § 1º que o pagamento dos JCP fica condicionado à existência de lucro.2. A legislação não impõe que a dedução dos juros sobre capital próprio deva ser feita no mesmo exercício-financeiro em que realizado o lucro da empresa. Ao contrário, permite que ela ocorra em ano-calendário futuro, quando efetivamente ocorrer a realização do pagamento ou o creditamento, em consonância com o regime de caixa. Precedente do STJ. 4. Remessa Oficial e Apelação desprovidas.” (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApReeNec – APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO – 5001514-88.2017.4.03.6109, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 11/02/2020, Intimação via sistema DATA: 13/02/2020)
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.