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COSIT – Incide IRPJ e CSLL nos resultados das aplicações financeiras de cooperativas

Nos termos da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que criou o regime jurídico das sociedades cooperativas, as cooperativas são sociedades de pessoas, criadas para possibilitar a prestação de serviços aos seus associados,  com forma e natureza jurídica próprias, sem objetivo de lucro (artigos 3º e 4º).

Tendo em  vista que não tem o objetivo de lucro, referidas sociedades não estão sujeitas à tributação sobre a renda, em relação aos atos cooperativos praticados com os seus associados.

São considerados atos cooperativos aqueles praticados entre a cooperativa e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para consecução dos objetivos sociais.

Por outro lado, atos não-cooperativos são aqueles que importam em operação com terceiros não associados. São exemplos, dentre outros, os seguintes: fornecimento de bens ou serviços a não associados; as aplicações financeiras; contratação de bens e serviços de terceiros não associados.

A Lei nº 5.764, de 1971, permite que as sociedades cooperativas realizem alguns atos não cooperativos relacionados nos arts. 85, 86 e 88, sem perder a condição de sociedades cooperativas.  No entanto, a mesma lei determina que essas operações devem ser contabilizadas em separado, segregando-se os resultados obtidos com não associados.

No artigo 111 está estabelecido que serão considerados como renda tributável os resultados positivos obtidos pelas cooperativas nas operações de que tratam os artigos 85, 86 e 88 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971

Com base nessas premissas, a Solução de Consulta nº 102 – Cosit de 17 de agosto de 2018 decidiu que os rendimentos obtidos pelas sociedades cooperativas em aplicações financeiras são tributáveis pelo IRPJ e CSLL, pois não têm natureza de ato cooperativo. Estabeleceu também que o resultado positivo advindo da prática de atos não cooperativos deve ser destinado integralmente ao Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social, sendo vedada sua distribuição aos associados.

Esse entendimento em verdade já havia sido pacificado no âmbito do STJ, que tem a a Súmula STJ nº 262 no sentido de que “Incide o Imposto de Renda sobre o resultado das aplicações financeiras realizadas pelas cooperativas”.

No REsp 58265/SP, tema repetitivo 240, se decidiu exatamente na mesma linha, conforme ementa:

“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. RESULTADO POSITIVO DECORRENTE DE APLICAÇÕES FINANCEIRAS REALIZADAS PELAS COOPERATIVAS. INCIDÊNCIA. ATOS NÃO-COOPERATIVOS. SÚMULA 262/STJ. APLICAÇÃO.

O imposto de renda incide sobre o resultado positivo das aplicações financeiras realizadas pelas cooperativas, por não caracterizarem “atos cooperativos típicos” (Súmula 262/STJ).

A base de cálculo do imposto de renda das pessoas jurídicas (critério quantitativo da regra matriz de incidência tributária) compreende o lucro real, o lucro presumido ou o lucro arbitrado, correspondente ao período de apuração do tributo.

O lucro real é definido como o lucro líquido do exercício ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação tributária (artigo 6º, do Decreto-Lei 1.598/77, repetido pelos artigos 154, do RIR/80, e 247, do RIR/99).

As sociedades cooperativas, quando da determinação do lucro real, apenas podem excluir do lucro líquido os resultados positivos decorrente da prática de “atos cooperativos típicos”, assim considerados aqueles praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais (artigo 79, caput, da Lei 5.764/71).

O artigo 111, da Lei das Cooperativas (Lei 5.764/71), preceitua que são consideradas rendas tributáveis os resultados positivos obtidos pelas cooperativas nas operações de aquisição de produtos ou de fornecimento de bens e serviços a não associados (artigos 85 e 86) e de participação em sociedades não cooperativas (artigo 88), assim dispondo os artigos 87 e 88, parágrafo único, do aludido diploma legal (em sua redação original):

“Art. 87. Os resultados das operações das cooperativas com não associados, mencionados nos artigos 85 e 86, serão levados à conta do ‘Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social’ e serão contabilizados em separado, de molde a permitir cálculo para incidência de tributos.

Art. 88. Mediante prévia e expressa autorização concedida pelo respectivo órgão executivo federal, consoante as normas e limites instituídos pelo Conselho Nacional de Cooperativismo, poderão as cooperativas participar de sociedades não cooperativas públicas ou privadas, em caráter excepcional, para atendimento de objetivos acessórios ou complementares.

Parágrafo único. As inversões decorrentes dessa participação serão contabilizadas em títulos específicos e seus eventuais resultados positivos levados ao ‘Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social’.”

Outrossim, o Decreto 85.450/80 (Regulamento do Imposto de Renda vigente à época) preceituava que:

“Art. 129 – As sociedades cooperativas, que obedecerem ao disposto na legislação específica, pagarão o imposto calculado unicamente sobre os resultados positivos das operações ou atividades:

I – de comercialização ou industrialização, pelas cooperativas agropecuárias ou de pesca, de produtos adquiridos de não associados, agricultores, pecuaristas ou pescadores, para completar lotes destinados ao cumprimento de contratos ou para suprir capacidade ociosa de suas instalações industriais (Lei n. 5.764/71, artigos 85 e 111);

II – de fornecimento de bens ou serviços a não associados, para atender aos objetivos sociais (Lei n. 5.764/71, artigos 86 e 111).

III – de participação em sociedades não cooperativas, públicas ou privadas, para atendimento de objetivos acessórios ou complementares, desde que prévia e expressamente autorizadas pelo órgão executivo federal competente (Lei n. 5.764/71, artigos 88 e 111).

§1º É vedado às cooperativas distribuir qualquer espécie de benefício às quotas-partes do capital ou estabelecer outras vantagens ou privilégios, financeiros ou não, em favor de quaisquer associados ou terceiros, excetuados os juros até o máximo de 12% (doze por cento) ao ano atribuídos ao capital integralizado (Lei n.5.764/71, art. 24, § 3º, e Decreto-Lei n. 1.598/77, art. 39, I, b).

§2º A inobservância do disposto no parágrafo anterior importará tributação dos resultados, na forma prevista neste Regulamento.”

Destarte, a interpretação conjunta dos artigos 111, da Lei das Cooperativas, e do artigo 129, do RIR/80, evidencia a mens legislatoris de que sejam tributados os resultados positivos decorrentes de atos não cooperativos, ou seja, aqueles praticados entre a cooperativa e não associados, ainda que para atender a seus objetivos sociais.

Deveras, a caracterização de atos como cooperativos deflui do atendimento ao binômio consecução do objeto social da cooperativa e realização de atos com seus associados ou com outras cooperativas, não se revelando suficiente o preenchimento de apenas um dos aludidos requisitos.

Ademais, o ato cooperativo típico não implica operação de mercado, ex vi do disposto no parágrafo único, do artigo 79, da Lei 5.764/71.

Conseqüentemente, as aplicações financeiras, por constituírem operações realizadas com terceiros não associados (ainda que, indiretamente, em busca da consecução do objeto social da cooperativa), consubstanciam “atos não-cooperativos”, cujos resultados positivos devem integrar a base de cálculo do imposto de renda.

Recurso especial da Fazenda Nacional provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008”.

(REsp 58.265/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010)