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Subvenções de custeio (créditos presumidos de ICMS) não integram a base do PIS/Cofins e Repercussão Geral

A concessão de incentivos fiscais relativos ao ICMS é uma prática que tem sido adotada como meio de atrair e manter investimentos pelos Estados e Distrito Federal. Dentre os benefícios concedidos, os créditos presumidos de ICMS, também conhecidos como créditos outorgados, são os mais utilizados.

Créditos presumidos são créditos fictícios lançados na escrita fiscal que resultam em diminuição ou anulação da carga tributária da mercadoria.  Não são originados pelas entradas de mercadorias tributadas pelo ICMS. Consubstanciam-se em uma presunção de crédito do imposto estadual sobre valores apurados com substrato nas operações realizadas pelo contribuinte.

Grande parte dos créditos presumidos de ICMS têm natureza jurídica de subvenções. O termo subvenção é originário do latim “subventione” e significa ajuda outorgada por entes públicos em caráter suplementar. Por meio das subvenções o Poder Público incentiva determinadas atividades que tem interesse em fomentar. Apesar de ser uma liberalidade, sua outorga se dá em vista do cumprimento de uma finalidade que é de interesse geral.

A atividade do estado em conceder subvenções é decorrente da sua função administrativa e encontra fundamento na supremacia do interesse público sobre o particular e da indisponibilidade do interesse público. Ou seja, é uma atividade caracterizada pela outorga de vantagens e benefícios aos particulares que atuam de acordo com o desejo estatal, e por causa de sua opção recebem um tratamento especial.

Modesto Carvalhosa ensina que as subvenções são “ajudas ou auxílios pecuniários, concedidos pelo Estado, em favor de instituições que prestam serviços ou realizam obras de interesse público.” (Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. 3,  São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, p. 603).

José Souto Maior Borges leciona que “O conceito de subvenção está sempre associado à idéia de auxílio, ajuda – como indica a sua origem etimológica (subventio) – expressa normalmente em termos pecuniários. Entretanto, se bem que a subvenção, em Direito Civil, constitua uma forma de doação, caracterizando- se, portanto, pelo seu caráter não compensatório, no Direito Público, particularmente no Direito Financeiro, embora também se revista de caráter não remuneratório e não compensatório, deve submeter-se ao regime jurídico público relevante. A subvenção pressupõe sempre o concurso de dinheiro ou outros bens estatais. É categoria de Direito Financeiro e não de Direito Tributário.” (in Subvenção Financeira, Isenção e Deduções Tributárias, Revista de Direito Público, V. 41 e 42. p. 43.)

Vale dizer, a subvenção é uma ferramenta à disposição do Poder Público utilizada para incentivar algumas atividades ou empreendimentos vinculados ao interesse público. Objetiva promover o estímulo de alguns setores econômicos ou regiões do país.

Subdividem-se em subvenções correntes para custeio ou subvenções para operação (expressões sinônimas) e subvenção para investimento.

Subvenções para investimento são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la na aplicação em bens ou direitos para implantar ou expandir empreendimentos econômicos (PN CST 112/78). São direcionadas para a expansão da empresa para implementar o parque industrial, e também, para o desenvolvimento de novas atividades econômicas. Exemplo típico são os créditos presumidos de ICMS concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos.

Subvenções correntes para custeio, objeto do presente estudo, são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la a fazer face ao seu conjunto de despesas, nas suas operações (PN CST 112/78).

Ocorre que existe discórdia doutrinária acerca da inclusão ou não das subvenções de custeio consubstanciadas em créditos presumidos de ICMS, na base de cálculo do PIS/Cofins das pessoas jurídicas enquadradas no regime de apuração não-cumulativo de que tratam as Leis nºs. 10.637/02 e 10.833/03.

Esta divergência não engloba o regime de apuração cumulativo do PIS/Cofins, pois nesta hipótese, as contribuições têm por base de cálculo o faturamento, cujo conceito já está consolidado pelo STF no sentido de abarcar apenas as receitas decorrentes da venda de mercadorias e serviços. Assim, por ser notório que as subvenções não se consubstanciam em entradas financeiras decorrentes da venda de mercadorias ou serviços, há concordância na doutrina no sentido de que estes benefícios concedidos pelos entes políticos não integram a base de cálculo do PIS/Cofins na sistemática cumulativa.

Contudo, a base de cálculo das contribuições ao PIS/Cofins das pessoas jurídicas enquadradas no regime de apuração não-cumulativo é definida nas leis que as criaram como a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. Desta forma, resta claro que a base de cálculo do PIS/Cofins apurados pelo sistema não cumulativo é mais ampla.

A ampliação foi possível porque o artigo 195, I, “b” da CF, na redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, autorizou a instituição de base de cálculo destas contribuições incidentes também sobre a receita, que tem um conceito mais abrangente do que faturamento. O conceito de faturamento abarca apenas as receitas decorrentes da venda de bens e serviços. Mas existem diversos outros tipos de receitas além das originárias da venda de bens e serviços, como por exemplo, as financeiras, aluguéis, royalties, dentre outras.

Ocorre que não existe consenso quanto a seguinte questão: As subvenções para custeio consubstanciadas em créditos presumidos de ICMS têm natureza de receita e integram a base de cálculo do PIS/Cofins apurados pelo sistema não cumulativo?

Esta pergunta é pertinente, porque quando a subvenção é recebida para compensar despesas da sociedade (subvenção para custeio), deve ser reconhecida como receita da entidade em conta de resultado.

Ocorre que, muito embora a contabilidade determine seu reconhecimento como receita, não se pode olvidar que “receita” não é um conceito contábil, mas um conceito jurídico, pois a contabilidade não engendra fatos e tampouco cria direitos, seu escopo consiste em averiguar os fatos, interpretá-los e historiá-los devendo reproduzir com fidelidade a realidade.

Marco Aurélio Greco ensina que receita não é um conceito contábil, mas, sim, “jurídico-substancial”, aduzindo que “a contabilidade retrata a realidade, mas não cria realidades jurídicas novas, desatreladas da substância subjacente” (“Revista Dialética de Direito Tributário” n. 50, p. 131).

De fato, uma classificação inapropriada do que seja receita, pode levar ao desatendimento das normas e à falta de compreensão do fenômeno jurídico. Se para um contador, o critério contábil é mais conveniente, para um operador do direito deve ser diferente. Na análise dos fenômenos jurídicos, a classificação deve ser norteada pelas regras do ordenamento jurídico.

Assim, a questão que se põe é analisar se subvenção para custeio se enquadra no conceito jurídico de receita, pois só assim há falar-se em incidência das contribuições ao PIS/Cofins.

Aliomar Baleeiro ensinava que: “receita pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo.” (in “Uma Introdução à Ciência das Finanças”, Forense, 14ª ed., fls. 116).

Tércio Sampaio Ferraz Júnior, por sua vez, define receita da seguinte forma: “receita é a quantidade de valor financeiro, originário de outro patrimônio, cuja propriedade é adquirida pela sociedade empresária ao exercer as atividades que constituem as fontes do resultado, conforme o tipo de atividade por ela exercida”. (Revista Forum de Direito Tributário, nº 28)

Bulhões Pedreira conceituou receita como “a quantidade de valor financeiro, originário de outro patrimônio, cuja propriedade é adquirida pela sociedade empresária ao exercer atividades que consistem as fontes do seu resultado” (Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia, Rio de Janeiro, Forense, 1989, p. 455).

Ricardo Mariz de Oliveira, na obra “Fundamentos do Imposto de Renda”, estudou detalhadamente o conceito de receita e concluiu:

“ – receita é um tipo de entrada ou ingresso no patrimônio da pessoa jurídica, sendo certo que nem todo ingresso ou entrada é receita;

– receita é um tipo de entrada ou ingresso que se integra ao patrimônio sem reserva, condição ou compromisso no passivo, acrescendo-o como elemento novo e positivo;

– a receita passa a pertencer à entidade com sentido de permanência;

– a receita remunera a entidade, correspondendo ao benefício efetivamente resultante de atividades suas;

– a receita provém de outro patrimônio, e se constitui em propriedade da empresa pelo exercício das atividades que constituem as fontes do seu resultado;

– a receita exprime a capacidade contributiva da entidade;

– a receita modifica o patrimônio, incrementando-o” (Ed. Quartier Latin, 2008, p. 102).

Considerando o conceito de receita, esses créditos presumidos não se revestem desta natureza, pois:

a) mesmo que evitem uma maior diminuição patrimonial não se consubstanciam em elemento positivo de aumento patrimonial, posto que não criam riqueza nova e tampouco expectativa de lucro;

b) não se caracterizam como ingresso de numerário ou direito no ativo;

c) são valores recebidos de terceiros gratuitamente;

d) os créditos não são alcançados em decorrência do exercício da atividade social da empresa e, portanto, está ausente o requisito da contraprestação por atividade;

e) não indicam a capacidade contributiva da entidade;

f) são verdadeiros auxílios recebidos por uma sociedade para fazer face às suas despesas, vale dizer, têm natureza de ressarcimento ou recuperação de despesas tributárias e jamais de receita.

Assim, a única conclusão possível é a de que estes valores não são tributados pelo PIS/Cofins, pois não têm a natureza jurídica de receita, apesar de contabilizados como tal.

Muito embora existam muitas soluções de consulta da Receita Federal e decisões do CARF em sentido contrário ao exposto acima, a jurisprudência do Poder Judiciário, no caso, do Superior Tribunal de Justiça, é francamente favorável a não inclusão destes valores na base de cálculo do PIS/Cofins.

Contudo, considerando que a Receita Federal entende que o valor apurado do crédito presumido do ICMS constitui receita tributável que deve integrar a base de cálculo do PIS/Cofins não-cumulativos, se os contribuintes quiserem ter o direito de excluir estes créditos da base de cálculo das contribuições devem entrar com uma ação judicial.

Recentemente, o STF reconheceu a repercussão geral da questão constitucional. Eis a ementa do julgado:

COFINS – PIS – BASE DE CÁLCULO – CRÉDITO PRESUMIDO DE IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – ARTIGOS 150, § 6º, E 195, INCISO I, ALÍNEA “B”, DA CARTA DA REPÚBLICA – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da constitucionalidade da inclusão de créditos presumidos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS nas bases de cálculo da Cofins e da contribuição ao PIS. (RE 835818 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 27/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 21-09-2015 PUBLIC 22-09-2015 ).

(post atualizado em 02 de 2016)

 

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  • Parabens Dra,,,
    Dra voce nao tem este texto em ingles,pra que eu possa divulgar no meu linkedin.
    Com sua autorizaçao.

    Obrigado ,

    Luciano

  • Dra. Gostei do seu texto. recentemente "tentei" fazer um tbm , todavia, voltado p nao incidencia de IRPJ/CSLL nos cred presumidos de ICMS como incentivo fiscal - subv. p investimentos.
    Adoro seu texto!! Parabéns
    Att Cristiane

  • Gostei de teu trabalho, principalmente por ter compartilhado.
    Amal Nasrallah, parabéns!
    L.Henrique

  • Neste texto existem importantes distingues conceituais mas destaco o da SUBVENÇÃO OUTORGADA. Exatamente este conceito não vem sendo observados por nossos Desembargadores do TRF 3ª e nem pelos julgadores do CARF. Refiro-me aos caos da desmutualização das Bolsas de Valores e de Mercadorias bem como da CETIP. Nestes casos também ocorreu uma situação de SUPERVENIÊNCIA ATIVA OUTORGADA que vem sido tributada pelos Auditores sob a camuflagem de mais valia auferida em DEVOLUÇÃO DE PATRIMONIO SOCIAL - LEI 9532/97-.

  • Boa tarde. E o que dizer do crédito de 50%, concedido ao IPI, previsto no artigo 227 do RIPI/2010. Integrará ou não a base das contribuições PIS e COFINS?

    Não esquecendo: Parabéns. Inclusive por suas outras publicações. São sempre críticas e contribuem em muito com o conhecimento daqueles que o buscam.

  • Muito bom o texto!
    No caso do crédito presumido do ICMS de MG, é obrigatório o estorno do crédito da etapa anterior, portanto o benefício se restringe à essa diferença, para oferecer à tributação, assim entendo.