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Aumento do PIS/Imp e COFINS/Imp pode ser questionado em algumas hipóteses

O governo federal resolveu aumentar as alíquotas do PIS e da Cofins incidentes sobre as importações por meio a Medida Provisória 668/2015, conforme mencionado no post “Publicadas novas alíquotas do PIS e Cofins incidentes sobre a importação” de 02/02/2015.

O diploma legal também modificou a norma que trata do reconhecimento de créditos fiscais em algumas hipóteses, como a revenda e reafirmou que a alíquota adicional de 1% para fins de cálculo da Cofins/Importação quanto a alguns bens importado não gera direito de crédito.

Ocorre que a majoração desses tributos é discutível em algumas hipóteses. Quando o importador efetua as importações de país que é signatário do General Agreement on Tariffs and Trade – GATT, do Tratado de Montevidéu de 1980, que constituiu a Associação Latino-Americana de Integração – ALADI, e do Tratado de Assunção, que constituiu o Mercado Comum do Sul – MERCOSUL, todos recepcionados pela legislação pátria.

Os mencionados tratados adotaram o princípio da não-discriminação do tratamento fiscal no que concerne às relações de comércio internacionais.

O princípio da não-discriminação do tratamento fiscal veda o tratamento fiscal discriminatório entre as partes signatárias do tratado internacional, de forma a evitar tratamentos fiscais menos favoráveis em relação ao comércio internacional, dentre outras hipóteses. Referido princípio se bifurca em dois tópicos: (i) o princípio da nação mais favorecida e (ii) o princípio do tratamento nacional.

O GATT elegeu o princípio da nação mais favorecida e o princípio do tratamento nacional, nos seus artigos I e III, in verbis:

“Artigo I

Tratamento Geral de Nação Mais Favorecida

1.Qualquer vantagem, favor, imunidade ou privilégio concedido por uma parte contratante em relação a um produto originário de ou destinado a qualquer outro país, será imediata e incondicionalmente estendido ao produto similar, originário do território de cada uma das outras partes contratantes ou ao mesmo destinado. Êste dispositivo se refere aos direitos aduaneiros e encargos de tôda a natureza que gravem a importação ou a exportação, ou a elas se relacionem, aos que recaiam sôbre as transferências internacionais de fundos para pagamento de importações e exportações, digam respeito ao método de arrecadação dêsses direitos e encargos ou ao conjunto de regulamentos ou formalidades estabelecidos em conexão com a importação e exportação bem como aos assuntos incluídos nos §§ 1 e 2 do art. III.

(…)

Artigo III

Tratamento Nacional em Matéria de Impostos e de Regulamentação

Internos

1.Os produtos de qualquer Parte Contratante importados no território de outra Parte Contratante serão isentos da parte dos tributos e outras imposições internas de qualquer natureza que excedam aos aplicados, direta ou indiretamente, a produtos similares de origem nacional. Além disto, nos casos em que não houver no território importador produção substancial de produto similar de origem nacional, nenhuma Parte Contratante aplicará tributos internos novos ou mais elevados sôbre os produtos de outras Partes Contratantes com o fim de conceder proteção à produção de produtos, diretamente competidores ou substitutos, não taxados de maneira semelhante; os tributos internos dessa natureza, existentes, serão objeto de negociação para a sua redução ou eliminação”.

A ALADI, constituída por ocasião do Tratado de Montevidéu de 1980, determina o atendimento ao princípio do tratamento nacional, no seu artigo 46, in verbis:

“Artigo 46

Em matéria de impostos, taxas e outros gravames internos, os produtos originários do território de um país-membro gozarão no território dos demais países-membros de um tratamento não menos favorável do que o tratamento que se aplique a produtos similares nacionais”.

 O MERCOSUL que foi constituído com o Tratado de Assunção, também dispõe que deve ser atendido o princípio do tratamento nacional, nos termos do seu artigo 7, in verbis:

“Artigo 7

Em matéria de impostos, taxas e outros gravames internos, os produtos originários do território de um Estado Parte gozarão, nos outros Estados Partes, do mesmo tratamento que se aplique ao produto nacional.”

 Diante dessas normas, não há dúvida de que nas relações de comércio internacional entre o Brasil e países signatários dos acordos acima referidos, deve ser aplicado o princípio da não-discriminação do tratamento, nas suas vertentes do princípio da nação mais favorecida e do princípio do tratamento nacional.

Em vista disso, a alíquota do Pis/Importação e Cofins/Importação incidentes sobre a importação de bens originários de País signatário do GATT, ALADI e MERCOSUL, não pode sofrer tratamento diferenciado do que o aplicado ao produto nacional.

Relembrando, o PIS/Importação e a Cofins/Importação foram criados para incidir sobre a importação de bens do exterior, com a finalidade de conferir tratamento isonômico entre a tributação dos bens produzidos no País, que sofrem a incidência do PIS e da Cofins no mercado interno, que passaram a ser tributados às mesmas alíquotas dessas contribuições.

Tendo em vista a existência de modalidades distintas de incidência do PIS e da COFINS – cumulativa e não-cumulativa – no mercado interno, nos casos dos bens importados para revenda ou para serem empregados na produção de outros bens, foi autorizado o desconto de créditos pelas empresas sujeitas à incidência não-cumulativa.

Vale dizer, o PIS/Importação e a Cofins/Importação, foram instituídos para dar um tratamento tributário isonômico entre os bens e serviços produzidos internamente e os importados: tributação às mesmas alíquotas e possibilidade de desconto de crédito para as empresas sujeitas à incidência não-cumulativa. As hipóteses de vedação de créditos vigentes para o mercado interno foram estendidas para os bens e serviços importados

Assim, ao aumentar PIS e Cofins do importador a MP 668/2015, tornou a carga tributária do produto importado muito mais alta, ferindo o princípio da não-discriminação eleito nos tratados internacionais indicados. Por esta razão, deve ser afastada a majoração de alíquotas e a restrição aos créditos.

Este entendimento que já se pacificou na jurisprudência com o advento da Súmula 575 do STF, assim redigida:

“575. À mercadoria importada de país signatário do GATT ou membro da ALALC estende-se a isenção do imposto de circulação de mercadoria concedida a similar nacional.”

Cumpre neste ponto lembrar, que o artigo 5º, parágrafo 2º da Constituição Federal preceitua que os direitos e garantias expressos na Constituição “não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”

Por sua vez, o artigo 98 do CTN dispõe que “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela legislação que lhes sobrevenha.”

O Supremo Tribunal Federal no RE 460.320 (ainda não definitivamente julgado) está apreciando o alcance do artigo 98 do CTN, sendo que o Ministro Gilmar Mendes avaliou a norma sob perspectiva atual considerando a globalização na economia.

Segundo o Ministro no atual contexto deve ser privilegiado o cumprimento dos acordos internacionais, visto que há crescente intensificação das relações internacionais, da interdependência entre as nações, das possibilidades de retaliação, da rapidez do acesso às informações, inclusive no que se refere ao cumprimento dos tratados internacionais firmados, e do retorno dos efeitos negativos do descumprimento dos acordos.

Ainda de acordo com o Ministro, admitir a preponderância da legislação interna, mesmo que posterior aos tratados internacionais, em detrimento a estes últimos desestimula o novo ingresso de capitais externos, gera insegurança dos investidores, dificulta a negociação de novos tratados, além de dar ensejo a retaliações em outras formas de cooperação. Além disso, o descumprimento unilateral de acordo internacional contraria os princípios internacionais fixados pela Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, a qual, em seu art. 27, determina que nenhum Estado “pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”.

Se assim é, fica evidente que está havendo inaceitável discriminação, em função de se atribuir tratamento fiscal mais favorável ao similar nacional, do que ao produto importado, devendo ser afastada reduzida a exigência do PIS e da Cofins incidentes na importação de produtos originários de países signatários do GATT, ALADI e MERCOSUL, equiparando-se à alíquota exigida no mercado interno dos produtos similares aos importados, originários de país signatário do GATT, ALADI e MERCOSUL.