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Os valores do Reintegra não podem integrar a base de cálculo do PIS e Cofins não cumulativos

O crescimento das exportações é prioridade para o desenvolvimento do País. Em vista disso, os produtos nacionais destinados ao exterior não devem ser onerados por tributos que prejudicam a sua competitividade no âmbito externo. Por esta razão a CF/88 estabeleceu que não pode recair  sobre as exportações o IPI (art. 153, §3º, III), o ICMS (art. 155, §2º, X, a), as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, tais como o PIS/PASEP e a COFINS (art. 149, § 2º, I).

Não obstante a determinação constitucional, as exportações ainda não são completamente desoneradas. Por exemplo, o PIS e a Cofins são tributos que não têm um regime não-cumulatividade total, pois somente são autorizados alguns créditos, que posteriormente serão deduzidos das contribuições a pagar. Assim, não é tão simples conseguir a total desoneração da carga tributária.

Para compensar esses vestígios tributários nas exportações de bens manufaturados e assim garantir a competitividade da indústria brasileira, foi criado por meio da Lei nº 12.546/2011 o REINTEGRA – Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários.

Por este regime, a pessoa jurídica exportadora de bens manufaturados apurará um valor calculado mediante a aplicação de percentual de 3% sobre a receita de exportação, que terá a finalidade de ressarcir parcial ou integralmente o resíduo tributário existente na sua cadeia de produção. Vale dizer, referido regime objetiva reintegrar valores (daí o nome reintegra) dos custos tributários federais que não foram eliminados e cumprir a determinação constitucional de total desoneração das exportações.

A exportadora poderá utilizar o valor apurado para: (i) efetuar compensação com débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; ou (ii) solicitar seu ressarcimento em espécie.

Vale transcreve parte da exposição de motivos da MP 540/11, que posteriormente se converteu na Lei 12.546/11, confirmando o quanto foi dito acima:

“5. Uma das principais dificuldades para as empresas domésticas acessarem o mercado internacional está na carga tributária que eleva o custo de produção no mercado doméstico penalizando o emprego e a produção. Reduzir os custos tributários na produção é um dos principais mecanismos para garantir a competitividade da indústria doméstica e a geração de emprego e renda.

6. A proposta de instituição do REINTEGRA, …, tem por objetivo reintegrar valores referentes a custos tributários residuais – impostos pagos ao longo da cadeia produtiva e que não foram compensados – existentes nas suas cadeias de produção. A partir do REINTEGRA será possível para as empresas exportadoras efetuarem compensação de resíduos tributários com débitos próprios ou mesmo solicitarem seu ressarcimento em espécie, em termos a serem estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil”.

Com a instituição do Reintegra surgiu uma nova discussão jurídica, qual seja, se o valor apurado no Reintegra compõe a base de cálculo no regime de apuração não cumulativa do PIS e Cofins. Saliento que alguns conceituam estes valores como subvenção para custeio, outros como ressarcimento, outros ainda como indenização, etc.

A Receita Federal em resposta a Solução de Consulta nº  195 de 18 de Outubro de 2012 – Disit 9 – decidiu que o  valor apurado no Reintegra compõe a base de cálculo no regime de apuração não cumulativa do PIS e da Cofins. O entendimento fiscal tem como base o argumento de que a base de cálculo do PIS e da Cofins não cumulativos engloba qualquer receita auferida.

Contudo, não é bem assim. Primeiro porque os valores do Reintegra não são receitas, pois independente da sua natureza (subvenção para custeio, recuperação de despesa, etc) não decorrem do exercício das atividades da empresa, não exprimem capacidade contributiva da sociedade e nem incrementam o patrimônio. Assim, estes valores não se enquadram no conceito de receita e, portanto, intributáveis pelo PIS ou pela Cofins.

Não importa como estes valores são contabilizados, pois como ensina Marco Aurélio Greco, receita não é um conceito contábil, mas, sim, “jurídico-substancial”, e “a contabilidade retrata a realidade, mas não cria realidades jurídicas novas, desatreladas da substância subjacente” (“Revista Dialética de Direito Tributário” n. 50, p. 131).

Além disso, o Reintegra tem a finalidade de desonerar as exportações e para tanto foi instituído um mecanismo de reintegração dos custos tributários residuais, visto que “não se exportam tributos”.  O objetivo da lei é exonerar de carga tributária os produtos exportados. A intenção do legislador não pode ser desvirtuada de forma a incluir na base de cálculo do PIS e da COFINS valores que, em última análise, decorrem da dispensa do pagamento das próprias contribuições ao PIS e Cofins, dentre outros tributos.  Desta forma, o entendimento fiscal importa em reduzir o estímulo fiscal, fazendo com que a desoneração almejada aconteça apenas em parte.

Considerando que a exportação de bens e serviços é imune das contribuições sociais do PIS e da Cofins, além de ser imune também ao IPI,  ICMS e das contribuições de intervenção no domínio econômico, o entendimento da Receita mostra-se mais incoerente ainda e fere a CF por via transversa.

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  • Prezada Amal, parabéns pelo seu excelente artigo, Suas considerações são muito sábias. Pena que a Receita Federal utilize um raciocínio tacanho para conceiturar incentivos fiscais como receita. Do ponto de vista contábil, o Reintegra é uma receita porque aumenta o PL da entidade em uma transação com terceiros. A exportação é uma atividade da empresa. Mas não tem sentido taxar a receita de um incentivo fiscal, principalmente no caso de exportações, como você habilmente argumenta..O mesmo raciocínio que vc fez com o Reintegra pode ser utilizado para o Crédito Presumido do IPI para as pessoas jurídicas exportadores contribuintes do PIS e da COFINS no regime cumulativo. Acredito que uma saída seria considerá-los como receitas de doações do poder públco e, portanto, não sujeitas à tributação, desde que constituída uma reserva de lucros do mesmo valor.

  • Cara Amal, muito bons argumentos, resumidos no texto simples e objetivo. Lhe pergunto como analisa questão similar relativa a inclusão ou não de créditos por incentivos fiscais estaduais (descontos de ICMS) na base de receitas tributáveis por Pis/Cofins.

    • Olá Luciano
      Esta pergunta é muita ampla, pois os créditos presumidos de ICMS têm diversas naturezas, mas em geral, têm características de subvenção para investimento, ou subvenção para custeio.
      Já analisei algumas hipóteses e a grande maioria desses créditos, no meu entendimento, não compõem a base de cálculo do PIS e da Cofins.
      Contudo, ressalto que a Receita Federal entende que quando estes créditos têm características de subvenções para custeio integram a base do PIS e da Cofins. Existem posições minoritárias da Receita Federal (soluções de consulta) que também entendem que as subvenções para investimento integram a base do PIS e da Cofins.
      Mas o Judiciário, em especial o STJ, tem posição, geralmente, favorável ao contribuinte.
      Esta divergência se deve ao fato que a Receita se prende na questão contábil e as subvenções transitam pelo resultado.
      Por outro lado, o Judiciário analisa a questão mais do ponto de vista jurídico-legal e dá maior relevância à natureza jurídica dos créditos. Por esta razão, em muitos casos, acabam determinando a exclusão dos créditos presumidos da base de cálculo do PIS e Cofins (sobre isto indico o post do meu blog chamado "Afinal, crédito presumido de ICMS integra ou não a base de cálculo do PIS e da COFINS não-cumulativos?"
      ab

      • Grato Amal pelos comentários. Concordo com vosso entendimento, consoante ao texto do post indicado.