Para atender a determinação constitucional foi editada a Lei nº 12.546/2011, que criou a contribuição previdenciária incidente sobre a receita bruta – CPRB – para alguns setores da economia, tais como hoteleiro, moveleiro, aéreo, plástico, dentre outros.
Alguns contribuintes, com dúvidas quanto a amplitude da base de cálculo da nova contribuição, apresentaram consultas à Receita Federal para que esta definisse os itens que englobariam a receita bruta.
Sobreveio a “Solução de Consulta nº 45 de 14 de Junho de 2012” – Disit 4, estabelecendo que a base de cálculo da CPRB inclui não apenas os valores decorrentes da venda de bens e serviços, mas todos os ingressos de qualquer outra natureza auferidos pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa, conforme transcrição:
“Para os fins da citada CPRB, considera-se receita bruta o valor percebido na venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia, bem como o ingresso de qualquer outra natureza auferido pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa. Porém, não integram tal base de cálculo: a) as vendas canceladas; b) os descontos incondicionais concedidos; c) o valor do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI destacado em nota fiscal, e d) o valor do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS devido pelo vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário, desde que destacado em documento fiscal” (parte da “Solução de Consulta nº 45 de 14 de Junho de 2012” – destaques nossos).
No entanto, a decisão está equivocada, pois não é isto que de depreende da leitura das normas que tratam do tema.
A Lei nº 12.546/2011 pretende que a CPRB incida sobre a receita bruta, que compreende apenas o produto da venda de bens e serviços, com a exclusão de alguns itens, tais como, vendas canceladas, descontos incondicionais, IPI, ICMS, receita de exportações.
Partimos para análise das normas:
O artigo 8o Lei nº 12.546/2011 estabelece que algumas empresas fabricantes, tais como, de autopeças, têxtil, móveis, plásticos, dentre outras, contribuirão sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, à alíquota de 1% (um por cento). Esclarece, ainda, no § 1º, que a contribuição aplica-se apenas em relação aos produtos industrializados pela empresa; e que não se aplica a empresas que se dediquem a outras atividades, além das previstas na lei, cuja receita bruta decorrente dessas outras atividades seja igual ou superior a 95% (noventa e cinco por cento) da receita bruta total. Eis o dispositivo:
“Art. 8o Até 31 de dezembro de 2014, contribuirão sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, à alíquota de 1% (um por cento), em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, as empresas que fabricam os produtos classificados na Tipi, aprovada pelo Decreto nº 7.660, de 23 de dezembro de 2011, nos códigos referidos no Anexo desta lei.
§ 1o O disposto no caput:
I – aplica-se apenas em relação aos produtos industrializados pela empresa;
II – não se aplica:
a) a empresas que se dediquem a outras atividades, além das previstas no caput, cuja receita bruta decorrente dessas outras atividades seja igual ou superior a 95% (noventa e cinco por cento) da receita bruta total”
Por outro lado, a lei determinou que a CPRB irá incidir sobre a receita de determinadas atividades econômicas realizadas por algumas empresas. Vale dizer, a CPRB incide sobre a receita das atividades mencionadas na lei que a criou e nada mais.
Tanto é assim, que a empresa que tiver outras atividades não relacionadas na Lei nº 12.546/2011 que criou a CPRB, deverá calcular e recolher sobre demais receitas a contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salários. Isto está claro no § 1o , do artigo 9º da lei, que enuncia que, no caso de empresas que se dedicam a outras atividades além das previstas, a contribuição previdenciária incidirá da seguinte forma:
– Sobre a receita da atividade relacionada na lei (ex. atividade moveleira), incidirá a CPRB (inciso I, do § 1o , do artigo 9º)
– Sobre as demais receitas oriundas de atividades não relacionadas na lei, será recolhida a contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salário (inciso II, do § 1o , do artigo 9º). Eis o teor do dispositivo:
“Art. 9o (…)
§ 1o No caso de empresas que se dedicam a outras atividades além das previstas nos arts. 7o e 8o, até 31 de dezembro de 2014, o cálculo da contribuição obedecerá:
I – ao disposto no caput desses artigos quanto à parcela da receita bruta correspondente às atividades neles referidas; e
II – ao disposto no art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, reduzindo-se o valor da contribuição a recolher ao percentual resultante da razão entre a receita bruta de atividades não relacionadas aos serviços de que trata o caput do art. 7o ou à fabricação dos produtos de que trata o caput do art. 8o e a receita bruta total, apuradas no mês.”
É importante ressaltar que o próprio Ministério da Fazenda publicou a chamadas “Cartilha de desoneração” na qual profere este exato entendimento:
“Se uma empresa produzir tipos diferentes de produtos ou prestar diferentes tipos de serviços, sendo apenas alguns deles elencados na Medida Provisória, então ela deverá proporcionalizar sua receita de acordo com os serviços/produtos enquadrados e não-enquadrados na Medida Provisória e recolher a contribuição previdenciária em duas guias: uma parcela sobre a receita e outra parcela sobre a folha”
(…)
“Se, por exemplo, uma empresa tiver 70% de sua receita derivada de produtos enquadrados na Medida Provisória e 30% de fora, então ela deverá recolher a alíquota de 1% sobre 70% de sua receita e aplicar a alíquota previdenciária normal, de 20%, sobre 30% de sua folha salarial.
Digamos que a receita de uma empresa nesta situação seja de 1000 e sua folha de salários de 200. Atualmente, essa empresa recolhe 20% de 200, pagando 40 de contribuição previdenciária. Pela nova sistemática, ela pagará 19 (1% x 70% x 1000 + 20% x 30% x 200)”
(http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2012/cartilhadesoneracao.pdf)
Como se vê, a CPRB incide apenas sobre a receita das atividades elencadas na lei e não há como se pretender ampliar a base de cálculo para incluir “o ingresso de qualquer outra natureza auferido pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa”, como quer a Solução de Consulta 45.
De se lembrar, ainda, que o Supremo Tribunal Federal tem reiterado constantemente o seu entendimento de que receita bruta, que é a base de cálculo da CPRB, compreende o valor auferido com a venda de mercadorias e serviços, conforme precedente recentíssimo que se transcreve:
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS E COFINS. BASE DE CÁLCULO. EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que receita bruta e faturamento são sinônimos, significando ambos o total dos valores auferidos com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. Precedentes.
2. Agravo regimental desprovido”.
(RE 656284 AgR, Relator: Min. Ayres Britto, Segunda Turma, julgado em 28/02/2012, Processo Eletrônico DJe-121, divulgado 20-06-2012 e publicado 21-06-2012)
Além disso, o conceito de receita bruta, segundo o Regulamento do Imposto de Renda – RIR/99 – compreende apenas as receitas das venda de bens e serviços:
“Receita Bruta
Art. 279. A receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de conta alheia (Lei nº 4.506, de 1964, art. 44, e Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12).
Parágrafo único. Na receita bruta não se incluem os impostos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante, dos quais o vendedor dos bens ou o prestador dos serviços seja mero depositário”.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.
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Admiro muito seus comentários, e sempre bem explicado.
Muito Bom! Parabéns pelo blog!
Desde que o conheci, tomei como referência para minhas leituras. Continue com esse excelente e proveitoso trabalho.
Bom dia,
Primeiramente parabéns pelo artigo, no entanto, me parece que a maior dúvida em relação a CPRB de fato não está na definição do que servirá de base de cálculo para a contribuição, mas sim, naquilo que se utilizará como receita bruta para o cálculo da proporcionalidade, no caso das empresas que industrializem produtos "incentivados e "não incentivados". Pois entendo que de fato, 1% irá incidir somente sobre os produtos referentes às NCMs informadas nos anexos I e II do Decreto nº 7.828/2012, porém, no momento de se calcular o percentual de quanto não é "incentivado" é que se faria o cálculo da proporcionalidade, e neste caso se considerarmos, por exemplo, outras receitas que não as decorrentes das vendas de produtos, a exemplo das financeiras, teremos proporcionalmente um percentual maior a incidir sobre a folha da pagamento da empresa, que me parece ser o que Receita Federal exigirá dos contribuintes, conforme já demonstrado na solução de consulta RFB nº 45.
Abraço!
Prezado Antonio
Eu não sei se entendi direito sua colocação, mas a Solução de Consulta 45 trata da base de cálculo da CPRB, conforme transcrevo:
“de modo que, na respectiva base de cálculo, deve ser incluída, portanto, a receita bruta auferida por filiais, ainda que, na hipótese, estas últimas exerçam, exclusivamente, atividade comercial. Para os fins da citada CPRB, considera-se receita bruta o valor percebido na venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia, bem como o ingresso de qualquer outra natureza auferido pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa.
Assim, a solução de consulta define receita bruta (bc da CPRB) e manda incluir na base de cálculo ingresso de qualquer outra natureza, sendo irrelevante o tipo de atividade exercida.
abraço
Prezada Amal, boa tarde!
Ok, entendo seu posicionamento, e também concordo que realmente a base de cálculo à CPRB compreende apenas o produto da venda de bens e serviços, com a exclusão de alguns itens, tais como, vendas canceladas, descontos incondicionais, IPI, ICMS, receita de exportações. No entanto levanto outra questão, que é:
Ao calcularmos a proporcionalidade, devemos incluir como receita bruta total as demais receitas, a exemplo das financeiras?
Utilizo o seu exemplo para dar números à minha dúvida:
"Digamos que a receita de uma empresa nesta situação seja de 1000 e sua folha de salários de 200. Atualmente, essa empresa recolhe 20% de 200, pagando 40 de contribuição previdenciária. Pela nova sistemática, ela pagará 19 (1% x 70% x 1000 + 20% x 30% x 200)”
1) CÁLCULO 01:
Venda de produtos = 700
Receita financeira = 300
Receita bruta total = 1.000
Folha de pagamento = 200
CPRB = 700 X 1% = 7
Contr. patronal s/ folha pagto = 300 / 1000 = 30% X 20% = 6% X 200 = 12
Total de contrib. previdenciária = 7 + 12 = 19. Exatamente igual ao seu cálculo.
2) CÁLCULO 02:
Agora note se tirarmos do conceito de receita bruta total as receitas financeiras:
Venda de produtos = 700
Receita bruta total = 700
Folha de pagamento = 200
CPRB = 700 X 1% = 7
Contr. patronal s/ folha pagto = 0
Total de contrib. previdenciária = 7
Penso que esta sim é a grande dúvida em relação a CPRB, o conceito de receita bruta total, engloba as demais receitas, mesmo que não relacionadas à atividade fim da empresa, como por exemplo as financeiras, venda de imobilizado, etc.???
Desde já muito obrigado pela atenção!
Prezado Antonio
Quando do cálculo da proporcionalidade, no meu entendimento, não devem ser consideradas receitas que não sejam decorrentes da venda de bens e serviços.
Este também é o posicionamento do Ministério da Fazenda na Cartilha de desoneração. Transcrevo novamente:
“Se uma empresa produzir tipos diferentes de produtos ou prestar diferentes tipos de serviços, sendo apenas alguns deles elencados na Medida Provisória, então ela deverá proporcionalizar sua receita de acordo com os serviços/produtos enquadrados e não-enquadrados na Medida Provisória e recolher a contribuição previdenciária em duas guias: uma parcela sobre a receita e outra parcela sobre a folha”
Ou seja, o MF está se dizendo que se uma empresa produzir tipos diferentes de serviços/produtos , sobre aqueles serviços/produtos que estão na lei incidirá a CPRB, sobre os demais serviços/produtos não enquadrados, será recolhida a contribuição sobre a folha de salário. Está se falando apenas da receita de produtos e serviços.
Utilizo o exemplo da Cartilha do MF para demonstrar:
"Digamos que a receita de uma empresa nesta situação seja de 1000 e sua folha de salários de 200. Atualmente, essa empresa recolhe 20% de 200, pagando 40 de contribuição previdenciária. Pela nova sistemática, ela pagará 19 (1% x 70% x 1000 + 20% x 30% x 200)”
CÁLCULO:
Venda de produtos constante da lei (ex. plástico) = 700
Venda de produto não constante da lei (ex. doces) = 300
Receita bruta total = 1.000
Folha de pagamento = 200
CPRB = 700 X 1% = 7
Contr. patronal s/ folha pagto = 300 / 1000 = 30% X 20% = 6% X 200 = 12
Total de contrib. previdenciária = 7 + 12 = 19.
Vale dizer, a proporcionalidade se dá pela receita decorrente de venda de produtos e serviços.
Abraço
Professora Amal, tenho acompanhado seus comentários e sempre concluo que são extremamente pertinentes, abrangentes, e como não poderia deixar de ser, são esclarecedores, objetivos, e de enorme importancia e utilidade para meu trabalho. Muito grato. Sucesso em seu trabalho.
Ezequiel Camargo
Prezada Amal, bom dia!
Ok, muito obrigado pelos esclarecimentos.
Abraço!
Prezada Amal,
Para informação, foi publicado hoje no DOU o Parecer Normativo nº 3, da RFB, tratando deste assunto.
Abraço!
obrigada pela informação
Estou começando agora no setor fiscal e devido a obrigatoriedade de apresentação da EFD_Contribuições, precisei tomar ciencia da CPRB, tinha duvidas em que casos ela ocorreria e fiquei muito satisfeita ao encontrar este artigo que ao mesmo tempo que esclareceu minhas duvidas a respeito do assunto me proporcionou mais uma opção de fonte de informação. Vou adotar este blog como referencia para minhas leituras complementares. Parabens!!!