O drawback se subdivide em: isenção, suspensão e restituição de tributos. O drawback suspensão, que interessa no momento, consiste na suspensão dos tributos incidentes na importação de insumos (II, IPI, PIS, COFINS, PIS-Importação e COFINS-Importação) a ser utilizados na industrialização de produto que destinado à exportação.
Para efeitos de comprovação do adimplemento do compromisso de exportação no drawback suspensão, os produtos importados ou adquiridos no mercado interno com suspensão do pagamento dos tributos incidentes na importação podem ser substituídos por outros produtos, nacionais ou importados, da mesma espécie, qualidade e quantidade, importados ou adquiridos no mercado interno sem suspensão do pagamento dos tributos incidentes, nos termos, limites e condições estabelecidos pelo Poder Executivo (conforme artigo 17 da Lei 11.774/2008, na redação da Lei 12.350/2010). Vale dizer, se admite a fungibilidade dos produtos importados utilizados como insumos.
Contudo, nem sempre foi assim, antes de ser alterado pela Lei 12.350/2010, o artigo 17 da Lei 11.774/2008, previa apenas que os produtos nacionais adquiridos no mercado interno com suspensão do pagamento dos tributos poderiam ser substituídos por outros produtos nacionais da mesma espécie, qualidade e quantidade, nada mencionando sobre os importados. Isto levou a lavratura de inúmeros autos de infração até o ano de 2010, que serão ainda julgados pelo Judiciário, ou pelo CARF.
Nos autos de infração, geralmente se acusa o importador de não ter atendido o ato concessório do regime drawback suspensão sob o argumento de que a definição do “drawback” suspensão contida no Regulamento Aduaneiro interpretada literalmente, criava uma vinculação física entre os insumos importados e os produtos exportados. Ou seja, a fiscalização entendia que os mesmos componentes importados sob o regime do drawback suspensão deveriam ser utilizados nos produtos que serão exportados, não podendo ocorrer a substituição por outros componentes, ainda que idênticos e da mesma procedência.
Ocorre porém, que as normas que regem o “drawback” suspensão não podem ser interpretadas desta maneira simplista, sob pena de restar frustrado seu objetivo primordial que é o de incentivar as exportações. Com efeito, freqüentemente ocorrem atrasos até que produtos importados cheguem efetivamente aos estabelecimentos do importador, por motivos totalmente alheios à sua vontade, tais como greves dos trabalhadores portuários ou mesmo de outra natureza, além de condições climáticas e atrasos no porto de embarque.
Por outro lado, se interrompessem sua linha de produção toda vez que ocorressem tais atrasos, correriam os importadores o risco de não conseguir cumprir seus compromissos de exportação, podendo sofrer sanções pecuniárias que resultariam numa menor entrada de divisas para o País, sem falar nas conseqüências dessa interrupção de trabalhos para seus funcionários.
Assim é que, com freqüência, os importadores acabam se valendo de insumos anteriormente importados com tributação plena, que têm em estoque, para poder cumprir os compromissos de exportação assumidos. Esse procedimento não causava qualquer prejuízo à União, mas justamente o contrário, posto que graças a ele o objetivo do regime, que é o incentivo à exportação, era atingido.
Tratando especificamente desta matéria, esclarece Osiris Lopes da Silva, que foi Secretário da Receita Federal:
“A identificação da mercadoria importada, na sua participação no produto finalmente exportado, sob o ponto de vista dos regimes aduaneiros especiais, nas varias legislações aduaneiras existentes no mundo, pode ser submetida a dois princípios básicos: o da identidade e o da equivalência.
Pelo princípio da identidade, a mercadoria importada com os benefícios do regime tem de ser necessariamente empregada no produto exportado.
Já o princípio da equivalência é mais flexível, posto que possibilita não haja a rigidez da identidade, propiciando que o ajuste entre importação do insumo e sua exportação se dê dentro de determinado período. A vantagem da adoção desse princípio é o de se obter maior escala no processo produtivo, muitas vezes de natureza contínua, em que interrupções por falta de matéria-prima podem causar prejuízos ou incrementos significativos de custo.
A rigor no drawback – suspensão há que se provar, via laudo técnico que existe no produto exportado, um determinada proporção de insumo importado sob o regime. A questão ganha complexibilidade quando a empresa dispõe nos seus estoques do mesmo insumo de produção nacional e o de origem estrangeira, e ele tem a natureza de bem fungível, sendo objeto de transformação na sua integração ao produto final.
(…)
Prevalece, em termos concretos, no caso, o princípio da equivalência, cujo limite será sempre a quantidade do insumo importado, observada a proporção desse tipo de insumo no produto final.
(…)
O método interpretativo literal, dando valor à letra da lei, sem ampliá-la ou restringi-la consoante o que dispõe o art. 111, inc. I, do CTN, pode levar à conclusão, de que, em matéria de suspensão do crédito tributário, o art. 78 do Decreto-lei nº 37/66, consagra o princípio da identidade. Vale dizer, a mercadoria, …estrangeira, teria necessariamente de compor o produto final exportado, para que fosse considerado cumprido o compromisso de exportar, e, portanto, atingida a finalidade do regime.
A questão não pode ser resolvida com método interpretativo tão singelo. Há sérios e ponderáveis questionamentos científicos, com relação a tal rigidez interpretativa de caráter apriorístico. O intérprete deve ter ampla liberdade para determinar a vontade da lei.
No caso, em função da finalidade econômica do regime há de ser utilizado na determinação do sentido e alcance da lei, o método teleológico ou finalístico. Em outras palavras, não pode haver na interpretação desse dispositivo, a prevalência absoluta da interpretação literal. (…)” (Revista de Estudos Tributários nº 13 – Mai/Jun/2000 – Assunto Especial – páginas 147/149, doc. 06)
Por estas razões, no drawback suspensão a fungibilidade dos insumos importados, dentro do prazo de validade do ato concessório, autoriza a sua permuta por bens importados iguais no gênero, quantidade e qualidade e não descaracteriza a exportação objeto do compromisso do importador, no regime de Drawback.
Desta forma, os autos de infração que abrangem períodos anteriores a 2011 devem ser anulados.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.