X

Sentença confirma: não incide IRRF nas remessas ao exterior para pagamento de prestação de serviços quando existe acordo internacional

 

Os rendimentos de serviços não técnico oriundos do Brasil e recebidos por pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior estão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 25%.

De fato, o artigo 7º da Lei 9.779/1999 que trata desses serviços estabelece que “os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento“.

Por outro lado, dispõe o artigo 98 do Código Tributário Nacional – CTN, que “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.”

O Brasil firmou com diversos países Convenção para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Imposto de Renda, tais convenções são baseadas no Modelo para Acordos para Evitar a Dupla Tributação elaborado pela OCDE, nos quais consta a seguinte cláusula:

“ARTIGO VII – Lucros das Empresas

1. Os lucros de uma empresa de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado. Se a empresa exercer sua atividade desse modo, seus lucros poderão ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis a esse estabelecimento permanente.”

Sobre o conceito de “lucros das empresas”, eis os comentários ao artigo 7°, do Modelo de Convenção de Dupla Tributação Sobre o Rendimento e o Capital – OCDE 1977:

“Conquanto não se tenha julgado necessário definir a expressão “lucros” na Convenção, deve entender‑se, porém, que este termo empregado no presente artigo e noutros artigos da Convenção tem um sentido amplo e compreende todos os rendimentos auferidos na exploração de uma empresa. Esta acepção geral corresponde à utilização que a legislação fiscal da maior parte dos países membros da OCDE faz da referida expressão”.

Como se observa, a expressão “lucros” tem no contexto do artigo 7º sentido amplo, correspondendo a TODOS os rendimentos decorrentes da exploração da atividade da pessoa jurídica. Ou seja, qualquer rendimento auferido por uma pessoa jurídica na exploração de seu objeto social enquadra‑se, perfeitamente, no conceito de lucros.

A amplitude do conteúdo dessa expressão é muito clara nas versões em inglês e em francês do Modelo da OCDE, que são, respectivamente, “business profit” e “bénéfices des entreprises”. Ou seja, o lucro corresponde aos rendimentos auferidos no desenvolvimento do negócio da pessoa jurídica.

Assim, os rendimentos recebidos por uma pessoa jurídica na exploração de seu negócio, podem ser considerados como parte do lucro, ou seja, como lucro daquela pessoa jurídica. Ressalte‑se que a expressão “lucros de empresas” abrange, justamente, os rendimentos auferidos na exploração do objeto social da pessoa jurídica, ou seja, os rendimentos das operações por ela desenvolvidas.

Em se tratando de empresa prestadora de serviços localizada em outro País, os rendimentos auferidos com suas atividades incluem‑se no conceito de “lucros de empresas”, pois são efetivamente, resultado da exploração do respectivo objeto social.

Em sendo assim, quando os valores são remetidos a outro país com qual o Brasil tem acordo internacional, destinados ao pagamento de serviços prestados, é perfeitamente aplicável o artigo 7° da Convenção, devendo tais rendimentos ser tributados somente no país de residência do beneficiário.

Neste sentido a lição de Alberto Xavier em artigo intitulado “O Imposto de Renda na Fonte e os Serviços Internacionais – Análise de um Caso de Equivocada Interpretação dos arts. 7º e 21º dos Tratados” – RDDT nº 49:

“14. Em nossa opinião, a norma do art. 7° que atribui competência exclusiva ao Estado de domicílio, na hipótese de inexistência de estabelecimento permanente, é o “coração” de um tratado contra a dupla tributação. Sem a proteção que ela assegura à liberdade de circulação internacional de mercadorias e serviços, todas as demais cláusulas perdem grande parte do seu sentido.

15. Klaus Vogel ‑ sem dúvida a mais alta autoridade científica em matéria de tributação internacional – no seu monumental comentário à Convenção Modelo contra a dupla tributação, observa que o art. 7° abrange a mais importante categoria de rendimentos, o “lucro da empresa”, observando que de longe a maior porção do rendimento derivado da atividade econômica internacional entra nesta categoria. E, contrariando expressamente a opinião segundo o qual o art. 7° não se aplicaria aos serviços afirma, com referência ao caso de “lucros de empresas”:

“Traditionally, this concept is centred around commerce, including banking and finance, and crafts and trades and industry; more recently, the services sector has joined in”

16. Aliás o próprio art. 7°, no parágrafo correspondente ao § 7° do Modelo OCDE, revela que se aplica aos preços de venda de bens e serviços, como receitas componentes do lucro contábil, ao dispor que “quando os lucros compreenderem elementos de rendimentos especialmente Tratados noutros artigos da presente convenção, as respectivas disposições não serão afetadas pelas deste artigo”.

17. Trata‑se do princípio de prevalência dos regimes especiais ou do caráter residual da noção de lucro de empresa. Assim, se os elementos do lucro, isoladamente considerados, têm um tratamento especial (como é o caso dos dividendos, dos juros e dos royalties) aplicam‑se as disposições específicas que lhes respeitam. Se não têm um tratamento especial, como é o caso da venda de bens e serviços, aplica‑se o art. 7°.” (pag. 10 e seguintes)

Disto se conclui que:

a)             as remessas de valores em pagamento de serviços prestados sem transferência de tecnologia por empresa sediada em país com o qual o Brasil mantém acordo internacional contra a bitributação enquadram-se no Artigo VII – Lucros de Empresas da Convenção;

b)            não tendo a empresa estrangeira estabelecimento no Brasil, a tributação pelo imposto sobre a renda ocorre exclusivamente no país de residência da estrangeira, não podendo ser exigida a retenção e o recolhimento do IRF sobre os valores a este título remetidos.

Este entendimento acabou de ser novamente confirmado por sentença proferida em 31/01/2013, pelo Juiz Federal da 15ª Vara do Distrito Federal, processo nº 35352-82.2013.4.01.3400.

View Comments (0)

  • Numa das sentenças mais bagunçadas que eu já li na vida, Amal (há a troca do número da Lei nº 9.779/1999 duas vezes, não há a citação ao precedente do STJ...). Mas sim, certamente referendou o novo entendimento acerca da matéria. Comemoremos.