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Contrato de conta corrente entre holding e controlada não é mútuo, razão pela qual não incide o IOF

Existe uma espécie de contrato denominado contrato de conta corrente contábil, celebrado entre duas partes que não são instituições financeiras. Referido contrato é similar àqueles que são firmados entre uma instituição financeira e seu cliente.

Os contratos de conta corrente contábeis, admitidos no nosso país, são os pactos firmados entre duas pessoas, que resolvem fazer remessas entre si de valores (bens, títulos ou dinheiro), registrando os créditos em uma conta para futura análise do saldo exigível. É necessário fazer escrituração especial e anotação em livro próprio. Caracterizam-se como diversas movimentações financeiras, nas quais ocorre o registro de operações de crédito e débito, de natureza sucessiva e constante, configurando relação creditícia entre as partes.

Estes contratos são muito comuns entre as sociedades holdings e suas controladas, já que as holdings costumam ter como objeto social justamente a administração de conglomerados e possuem como atividade a participação acionária majoritária em uma ou mais empresas, detendo o controle e administração das estratégias empresariais, gerindo o caixa do grupo. Geralmente atuam como representantes das demais sociedades junto a órgãos governamentais, instituições financeiras, entidades de classe, além de prestar serviços centralizados.

Ocorre que o fisco federal tem autuado empresas que mantém contrato de conta-corrente com suas controladoras (holdings) exigindo IOF, por considerar que em verdade se trata de contrato de mútuo. E isto porque, o Ato Declaratório SRF nº 007 de 22 de janeiro de 1999 equiparou contrato de mútuo a contrato de conta-corrente. Eis os termos do item 1 do AD SRF 007/1999:

“1. No caso de mútuo entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física, sem prazo, realizado por meio de conta-corrente, o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários – IOF, devido nos termos do art. 13 da Lei n° 9.779, de 19 de janeiro de 1999”.

Ocorre que a Lei nº 9.779/99 no seu artigo 13 somente autoriza a cobrança de IOF nas operações de mútuo entre pessoas jurídicas, nada dispondo sobre o contrato de conta-corrente, conforme se transcreve:

“Art. 13. As operações de crédito correspondentes a mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física sujeitam-se à incidência do IOF segundo as mesmas normas aplicáveis às operações de financiamento e empréstimos praticadas pelas instituições financeiras.”

Desta forma, a determinação contida no AD SRF 007/1999 implica a criação de exigência tributária, o que é proibido, pois a ordem jurídica brasileira não admite a instituição de tributo por norma de hierarquia inferior à da lei, como no caso do AD SRF 007/1999 que é ato do executivo (Secretaria da Receita Federal). Isto viola os artigos 5º, II e 150, I, da CF/88 e o artigo 97 do Código Tributário Nacional, que consagram o princípio da legalidade estrita em matéria tributária

Felizmente, o CARF analisando uma questão similar a esta decidiu que, nesta hipótese, não incide o IOF, conforme ementa que se transcreve:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CRÉDITO, CÂMBIO E SEGUROS OU RELATIVAS A TÍTULOS OU VALORES MOBILIÁRIOS IOF. RECURSOS DA CONTROLADA EM CONTA DA CONTROLADORA. CONTA CORRENTE. RAZÃO DE SER DA HOLDING. Os recursos financeiros das empresas controladas que circulam nas contas da controladora não constituem de forma automática a caracterização de mútuo, pois dentre as atividades da empresa controladora de grupo econômico está a gestão de recursos, por meio de conta corrente, não podendo o Fisco constituir uma realidade que a lei expressamente não preveja. Recurso Voluntário Provido”  (Processo nº 11080.015070/200800, Acórdão nº 3101001.094, 1ª Câmara / 1ª Turma Ordinária, publicado em 04/07/2013)

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  • Prezada Amal,
    Primeiramente, parabéns por manter este espaço destinado a discussão de temas tributários relevantes.
    Há referência no texto a existência de um contrato de contas correntes contábeis. Eu sinceramente desconheço esta previsão. Poderia compartilhar este conhecimento conosco?
    Abs,
    Ricardo Rocha

    • Ricardo
      Não existe uma legislação que trata especificamente sobre este contrato, mas ele existe há muitos anos, e diversos civilistas, inclusive, do início do século passado, que já tratavam dele. Por isso, ele é aceito no ordenamento pátrio, sendo muito similar ao contrato de conta corrente de instituições financeiras.
      Disponibilizo bibliografia sobre o assunto:

      MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais . 9.ed.. Rio de Janeiro: Forense, 1988. P. 471 e se-guintes

      MIRANDA, Pontes de . Tratado de direito privado : parte especial (atualizado por Bruno Miragem), Editora RT, volume 42, p. 177 e seguintes.

      VIVANTE, Cesare. Instituições de direito comercial. 2.ed.. Lisboa: Livraria Clássica, 1918., p. 231 e seguintes.

  • Prezada Amal,
    Parabéns pelo blog!
    Acho que poucos têm o conhecimento deste tipo de operação. Até os sites pagos especializados em consultoria tributária sempre mencionam como contratos de mútuo.
    O modelo do contrato de conta corrente entre empresas do grupo é semelhante ao contrato de mútuo? Há modelos disponíveis?
    Grato

    • Olá José Carlos
      O contrato de conta corrente não é similar ao contrato de mútuo. Neste tipo de contrato não há mútuo e nem promessa de mútuo.Ele é similar ao contrato de uma conta corrente que um correntista mantém com uma instituição financeira. Na verdade o contrato de conta corrente é aquele em que duas pessoas decidem reunir valores em massa única e homogênea, por meio remessas sucessivas, que serão anotadas em contas com partidas de débito e crédito, sem que uma seja credora da outra, senão quando do encerramento da conta mediante balanço.
      Finalmente, eu não tenho um modelo disponível.

  • Dra Amal, trabalho em um grande grupo empresarial Gaúcho, utilizamos até o momento entre coligadas, o contrato de mútuo, entretanto pela matéria exposta, entendo que quando se tratar de emprestimo entre Holding e coligadas/controladas, poderíamos utilizar o contrato de conta corrente, sem ônus do IOF, correto? Quando for emprestimos entre coligadas/controladas, excetuando Holding, também é valido o contrato de conta corrente?

    • Me parece que o mais importante é que a sociedade controladora, não importa o nome que se lhe dê, tenha no seu estatuto ou contrato social, como atividade o controle e gestão e administração das coligadas e controladas.
      Desta forma, se justifica a posse do numerário na controladora, visto que esta administra a controlada ou coligada.
      Mas é importante destacar que o contrato de conta corrente não é similar ao contrato de mútuo.
      Para fazer uma analogia, veja que os contratos de conta-corrente com instituição financeira não têm qualquer relação com mútuo. O correntista deixa seu dinheiro no banco porque este lhe oferece em troca serviços que interessam ao correntista, mas não há empréstimo de dinheiro à instituição financeira.
      Assim, se efetivamente se tratar de mútuo o IOF é devido.

      • Dra. Amal, grata pela sua atenção, irei investigar mais profundamente sobre o caso para ver se realmente, podemos ou não, configurar as transações existentes hoje como conta corrente ou mútuo efetivo.

  • Dra. Amal,parabéns pelo artigo!Esta questão ja vem sendo bastante discutida entre os tributaristas.Entretanto,nunca tinham explicado a questão do contrato de conta corrente.Existira um caixa centralizado pela holding para cada coligada onde seriam registradas as operações?Obrigada.

    • Olá Nádia
      Não é exatamente um caixa, mas bem parecido.
      Segue abaixo as principais característica deste tipo de contrato, para que fique mais claro.
      Conceito - contrato de conta corrente é o contrato pelo qual as partes se obrigam a realizar lançamentos e anotações, em conta, dos créditos e débitos de um para com o outro (recíprocos), sendo que o saldo somente pode ser exigido no fechamento da conta. Sua principal utilização é facilitar operacionalmente as relações recíprocas entre as partes do contrato.
      No contrato de conta corrente, assim, como o contrato de conta corrente bancário, não há obrigação de nenhuma das partes de efetuar remessas para conta, porque não existe uma relação creditícia. É um contrato onde deve estar prevista a reciprocidade, ou seja, assim como a controlada ou coligada podem remeter valores para a conta, a controladora também pode fazer o mesmo, ou não (nesse ponto se diferencia do contrato de conta corrente bancário). Há um vínculo de ordem contabilista e o saldo somente é exigível ao final do contrato ou no final do ano, conforme constante no contrato.
      Outro fator é que não importa a origem do valor destinado à conta. Melhor explicando, os negócios que originaram o dinheiro que será lançado na conta não interessam para fins do contrato, assim como numa conta corrente de instituição financeira, onde são feitos depósitos sem seja importante (para fins deste tipo de contrato) declarar a origem do dinheiro. A origem somente deve ser mencionada para fins de registro de lançamentos de entradas e saídas.
      Outro aspecto importantíssimo é que ao crédito efetuado na conta não deve ser declarado a destinação específica, do mesmo modo que quando um correntista deposita o dinheiro no banco, não precisa declarar qual a finalidade que deve ser dada ao montante, justamente porque este contrato não envolve outros negócios ou qualquer relação obrigacional entre as partes.
      Neste contrato as partes se obrigam a diferir a exigibilidade dos respectivos créditos e a deles não dispor até o fechamento da conta, data que deverá ser estipulada no contrato.

  • Importante (e até surpreendente) precedente!
    Parabéns pelo "achado", Amal.
    Mas você entende que a formalização de um contrato é imprescindível para afastar o IOF?
    Grande abraço e parabéns pelos artigos tão diferenciados e práticos!

      • Obrigado pela resposta!
        Pela leitura do voto vencedor, pareceu-me que no caso em análise não houve celebração de qualquer tipo de contrato. Apenas afastou-se a qualificação, pelo Fisco, do saldo contábil entre as empresas ligadas como "mútuo", por tratar-se na essência de uma operação que cumpriria as características de um contrato de conta corrente.
        Concordo que a eventuais interessados em brigar pela causa é consideravelmente mais prudente a celebração um contrato de conta-corrente.
        Saudações e, novamente, parabéns pelos seus ótimos e oportunos artigos!

  • Dra. Amal, tudo bem? Preciso celebrar um contrato de conta corrente contábil, mas gostaria de um modelo, por favor. Obrigada, Eloisa.