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Apesar da decisão do STF, as guerras fiscais estão longe de ter um fim

O assunto da semana na área tributária é: “STF determina fim das guerras fiscais”.

Trata-se do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal de diversas ações diretas de inconstitucionalidade (ADINs). No caso, as ações foram ajuizadas por um Estado contra outro, ou ajuizadas por Associações contra um determinado Estado.

O que ocorre é que o ICMS é um imposto estadual que incide sobre a circulação (venda) de mercadorias. Este imposto é a maior fonte de receitas dos Estados. Como existem inúmeras operações interestaduais (comércio de mercadorias que transitam por diversos estados até chegar ao consumidor final), a Constituição Federal prevê com antecedência as regras gerais relativas a estas operações.

Vale dizer, a CF estabelece as diretrizes para repartir a arrecadação do ICMS interestadual entre os Estados considerando vários aspectos, como por exemplo, divisão deste imposto entre Estados produtores e os Estados não produtores, regras para criação de benefícios fiscais. E isto é assim, porque apesar do Brasil ser uma Federação e os Estados gozarem de independência, esta autonomia tem limites, pois não pode por em risco os princípios gerais e os interesses econômicos e sociais do país.

Pois bem, a Constituição Federal prevê que qualquer benefício fiscal, isenção e incentivo relativo ao ICMS só pode ser outorgado por meio de Convênio (acordo) firmado entre os Estados e o Distrito Federal (art. 155, § 2º, inciso XII, letra “g”, da CF). Isto significa que os Estados não podem dar benefícios fiscais sem o consentimento dos demais Estados.

Ocorre que, na prática, para atrair grandes indústrias e atacadistas os Estados concedem inúmeros favores fiscais sem a permissão dos demais Estados. E muito embora possa parecer bom, num primeiro momento, acaba tornando-se imensamente desfavorável a longo prazo, pois isto deflagra a famosa guerra fiscal, com um Estado concedendo mais benefícios do que o outro e, ao final ,gera uma “concorrência desleal” entre estes.

De fato, os incentivos fiscais acarretam diminuição da receita pública e isto pode levar a um desequilíbrio com despesas superiores às receitas, acabando por limitar a capacidade dos Estados de atender as necessidades básicas da população, como saúde, educação, moradia, saneamento, infra-estrutura. Todos os entes políticos acabam perdendo, inclusive a União e os Estados que com menor arrecadação ficam dependentes dos repasses federais. Por outro lado, as vantagens auferidas pelos Estados que concedem os incentivos, como a criação de empregos e investimentos locais, têm se mostrado frágeis e não sustentam esta política.

Por estas razões o Supremo Tribunal Federal acabou com incentivos oferecidos por leis e decretos de diversos Estados atingindo vários planejamentos fiscais realizados por grandes contribuintes, que se instalaram em determinados Estados, justamente por conta dos benefícios outorgados.

Contudo, o julgamento de ontem está muito longe de por fim às guerras fiscais. Alguns governadores já concederam entrevistas dizendo que as decisões não irão afetar as empresas que se instalaram no seu território com o objetivo de gozar desses incentivos.

É que nestes julgamentos, o Supremo Tribunal decide sobre um tema específico que foi levado ao seu conhecimento por meio de uma ação judicial. Desta forma, suas decisões afetam normas específicas. Ocorre que existem centenas de outras normas que concedem benefícios que jamais foram questionadas. Além disso, como já ocorreu em inúmeros casos, o Supremo julga uma norma estadual inconstitucional, que logo após é substituída por outra, que ao final outorga incentivos de outra maneira.

Essa é uma das razões pelas quais alguns pretendem a reforma tributária, com a substituição do ICMS pelo do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) que passaria a ser um tributo federal, intenção repudiada veementemente pelos Estados que tem receio de perder sua autonomia. Como se vê, a questão é extremamente complexa e necessita de muito debate.