As subvenções e Medida Provisória nº 1.185, de 2023, fazem parte do assunto mais comentado do momento na área tributária. A MP altera toda a tributação das subvenções.
As subvenções têm sido muito utilizadas pelos Estados e Distrito Federal como meio de atrair e manter investimentos nos seus territórios.
Por meio das subvenções o Poder Público incentiva determinadas atividades que tem interesse em fomentar. Apesar de ser uma liberalidade, sua concessão se dá em vista do cumprimento de uma finalidade que é de interesse geral.
A atividade do estado em conceder subvenções é decorrente da sua função administrativa e encontra fundamento na supremacia do interesse público sobre o particular e da indisponibilidade do interesse público. Ou seja, é uma atividade caracterizada pela outorga de vantagens e benefícios aos particulares, em geral empresas, que atuam de acordo com o desejo estatal, e por causa de sua opção recebem um tratamento especial.
Modesto Carvalhosa ensina que as subvenções são “ajudas ou auxílios pecuniários, concedidos pelo Estado, em favor de instituições que prestam serviços ou realizam obras de interesse público.” (Comentários à Lei das Sociedades Anônimas, v. 3, São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, p. 603). Vale dizer, a subvenção é uma ferramenta à disposição do Poder Público utilizada para incentivar algumas atividades ou empreendimentos vinculados ao interesse público. Objetiva promover o estímulo de alguns setores econômicos ou regiões do país.
Subdividem-se em subvenções correntes para custeio ou subvenções para operação (expressões sinônimas) e subvenção para investimento.
Subvenções para investimento são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la na aplicação em bens ou direitos para implantar ou expandir empreendimentos econômicos. São direcionadas para a expansão da empresa para implementar o parque industrial, e também, para o desenvolvimento de novas atividades econômicas. Vale dizer, visam incentivar setores econômicos ou regiões em cujo desenvolvimento haja interesse especial.
Subvenções correntes para custeio são transferências de recursos para uma pessoa jurídica com a finalidade de auxiliá-la a fazer face ao seu conjunto de despesas, nas suas operações, tem por finalidade compensar despesas operacionais.
Reinaldo Pizolio ensina, que “as subvenções correntes, que a lei tributária trata como direcionadas para o custeio ou para a operação, são aquelas concedidas à pessoa jurídica para que esta possa fazer frente aos seus custos, por assim dizer, comuns ordinários, como, por exemplo, necessidades de caixa ou determinados déficits operacionais. As subvenções para investimentos, por sua vez, caracterizam-se pela destinação dos recursos à empresa para que sejam aplicados em sua expansão, em alocação de valores para implementação de seu parque industrial, ou ainda, por exemplo, para que desenvolva novas atividades econômicas.” (in “Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Subvenções para Investimento”. Artigo in Revista Dialética de Direito Tributário, v. 52. São Paulo: Dialética, 2002, p. 149).
As subvenções para investimento, não são computadas para fins de determinação do Lucro Real e na base de cálculo da CSLL desde que sejam registradas na reserva de lucros. Contudo essa regra não se aplicava à subvenção para custeio que sempre estiveram sujeitas à tributação federal.
Essa diferença entre as duas subvenções foi alterada pela Lei Complementa (LC) nº 160/17, que mudou a tributação de incentivos fiscais de ICMS.
A LC nº 160/2017 incluiu os § 4º ao art. 30 da Lei nº 12.973/14, para estabelecer que “Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais” de ICMS convalidados no CONFAZ “são considerados subvenções para investimento”.
Essa norma incluía os benefícios que anteriormente se classificavam como subvenção para custeio. Vale dizer, a LC nº 160/17 tentou acabar com a divisão entre as espécies de subvenções ao considerar que todos os benefícios fiscais de ICMS convalidados sempre serão considerados subvenções de investimento.
Contudo, a Receita Federal não aceitou a nova norma e continuou a diferenciar as duas subvenções para fins de tributação.
Pois bem, cabe aqui um parênteses para explicar que ao julgar o EREsp 1517492, em 2017, o STJ decidiu que os créditos presumido de ICMS (espécie de benefício fiscal) não poderiam sofrer a incidência de IRPJ e CSLL, independentemente da natureza de subvenção que tivessem (custeio o investimento), tendo em vista que a União não poderia pretender tributar renúncias de receita conferidas pelos Estados, em homenagem ao pacto federativo.
Pois bem, no início desse ano ao julgar o tema 1182, REsp 1.945.110/RS, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o quanto definido no EREsp 1517492 em relação aos créditos presumidos de ICMS.
Quanto aos demais benefícios fiscais relacionados ao ICMS, – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros deveriam ser considerados como subvenção para investimento, independentemente de serem concedidos para implantação ou expansão de empreendimento econômico.
Contudo, o STJ afirmou também que: “considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os parágrafos 4º e 5º no artigo 30 da Lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu parágrafo 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou à expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSLL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.”
No dia 31 de agosto de 2023, o governo federal baixou a medida provisória 1185 tratando do tema. A MP produz efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024 e alterou toda a sistemática relacionada à tributação das subvenções para que a decisão do STJ deixasse de surtir efeitos.
Na exposição de motivos da MP consta que “a concessão de benefícios em caráter geral ou de forma incondicionada pelos Estados e pelo Distrito Federal, com decorrente redução das bases de cálculo de tributos federais, provoca impacto fiscal negativo na ordem de R$ 80 bilhões (oitenta bilhões de reais) ao ano, segundo estimativa realizada pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil” e conclui que “por essa razão, faz-se necessário modificar a legislação tributária a fim de estabelecer adequado tratamento aos incentivos fiscais federais relacionados às subvenções para investimentos concedidas pelos entes federados.”
Nessa mesma exposição de motivos há crítica direta ao STJ e ao próprio Congresso Nacional, veja: “ao pretender equiparar diversos benefícios concedidos pelos Estados relacionados ao ICMS a subvenções governamentais para investimento, os dispositivos promulgados causaram distorções tributárias, com impactos profundamente negativos para a arrecadação federal, além da insegurança jurídica e do aumento de litigiosidade tributária.”.
Cabe aqui esclarecer que o julgamento do STJ levou em conta a interferência do Governo Federal nos atos dos Governos Estaduais e concluiu que havia violação o princípio federativo.
Assim, mais uma vez o Governo Federal com uma MP que é um ato do Executivo, intenta jogar por terra anos de discussões no Poder Judiciário e no Poder Legislativo. Vale dizer, o que importa é somente a arrecadação federal, pouco importa o entendimento dos demais poderes políticos e a soberania dos estados membros.
Em síntese, se a nova MP vingar, a sistemática será outra. Não poderá mais haver exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Os valores dos incentivos deverão ser oferecidos à tributação. Além disso, a MP acaba por incluir esses valores na base do PIS e da Cofins.
Por outro lado, a pessoa jurídica tributada pelo lucro real que receber subvenção da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico poderá apurar crédito fiscal que pode ser objeto de ressarcimento em dinheiro ou compensação com débitos próprios, vincendos ou vencidos, relativos a tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.
Nem precisa mencionar que a nova sistemática apesar de conceder crédito fiscal, reduz sobremaneira o direito que as empresas tiveram reconhecido pelo Judiciário.
Além disso, a utilização do crédito fiscal se submete a diversas condições, tais como: o crédito fiscal somente poderá ser calculado após o fim da implantação ou da expansão do empreendimento econômico.
Ademais, na apuração do crédito fiscal, não poderão ser computadas: as receitas não relacionadas com as despesas de depreciação, amortização ou exaustão relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; a parcela das receitas que superar o valor dessas despesas; a parcela das receitas que superar o valor das subvenções concedidas pelo ente federativo; as receitas que não tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL; as receitas decorrentes de incentivos do IRPJ e do próprio crédito fiscal de subvenção para investimento; e f) as receitas reconhecidas após 31 de dezembro de 2028.
Resumindo. Mais uma vez haverá majoração da carga tributária das empresas.
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A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.