No dia 10 de janeiro foi publicada Lei 13.606/2018, que traz um polêmico artigo e de duvidosa constitucionalidade. Trata-se do artigo 25, que introduziu o artigo 20-B e parágrafos à Lei 10.522 de 19 de julho de 2002 (referida lei trata do CADIN – Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais).
A norma em questão informa que, inscrito o crédito em dívida ativa da União, o devedor será notificado para, em até cinco dias, efetuar o pagamento do valor atualizado monetariamente, acrescido de juros, multa e demais encargos nela indicados. Estabelece ainda que, não pago o débito no prazo de cinco dias, a Fazenda Pública poderá: comunicar a inscrição em dívida ativa aos órgãos que operam bancos de dados e cadastros relativos a consumidores e aos serviços de proteção ao crédito e congêneres; e averbar, inclusive por meio eletrônico, a certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis (averbação pré-executória).
Tal dispositivo fere a Constituição Federal inclusive cláusulas consideradas pétreas (normas constitucionais imutáveis, que sequer podem ser objeto de deliberação de proposta de emenda).
De fato, numa rápida análise, verifica-se que a CF/88 determina no seu artigo 5º a garantia ao direito de propriedade e ao devido processo legal, nos seguintes termos:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXII – é garantido o direito de propriedade;
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”
Note-se que o direito de propriedade se subdivide no direito de usar, gozar e dispor e no direito de reaver a coisa do poder de quem injustamente a ocupe, conforme disposto no artigo 1.228 do Código Civil:
“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
Por sua vez, o direito de dispor, significa o direito de abusar da coisa, o direito de alienar o bem, reformá-lo e até destruí-lo.
Para um proprietário ser privado dos seus bens, incluindo o direito de alienar, que é intrínseco ao direito de propriedade, somente através do devido processo legal. Note-se que um bem indisponível não pode ser alienado.
E o que é devido processo legal? É o princípio que garante a todos o direito a um processo com todas as etapas previstas em lei, dotado de todas as garantias constitucionais. Por processo, entenda-se processo judicial.
Ocorre que, a chamada averbação auto-executória permite que a Fazenda Nacional torne INDISPONÍVEL o bem, sem o devido processo legal, o que fere a CF/88 nas suas cláusulas pétreas pelas razões expostas.
A Autora é advogada, sócia da Nasrallah Advocacia, formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós Graduada em Direito Tributário pelo IBET – USP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, Integrou a Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP em 2018/2019. Membro da Associação dos Advogados de São Paulo. Atua no contencioso judicial e administrativo e na consultoria tributária e é consultora CEOlab.